terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Judicialização

Em um momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem ocupado um espaço relevante no cenário político;

Quando se constata a crescente transferência de poder das instâncias tradicionais, que são o Executivo e o Legislativo, para juízes e tribunais;

Abre-se mão do melhor instrumento concebido pela democracia que é a representatividade da população nos debates sobre o país.

Essa é a crise maior que o mundo atravessa e está expresso nas inúmeras manifestações populares que pipocam por todos os lados.

A forma cara das eleições foi uma criação proposital para que os representantes do povo ficassem refém do grande capital.

O resultado não poderia ser outro. Partidos fracos, políticos que não representam a sociedade, coligações esdrúxulas; - falência do modelo.

Surge a judicialização para substituir a falta do debate amplo na sociedade e os políticos se agacham à este ativismo do judiciário enquanto criticam a proposta de Dilma de maior participação social nos debates sobre o País.

A elite continua a optar por decisões  fechadas e monocromáticas transferindo agora para os Tribunais os debates e  as decisões que caberiam serem tomadas pelo povo através dos seus representantes eleitos.

Na judicialização, admitir que um indivíduo isoladamente impeça atos essenciais e inerentes de um dos poderes da república, usando de um artifício desconhecido da democracia, é reconhecer a completa incapacidade de atuação do nosso legislativo no uso das suas atribuições.

Trata-se da expansão do judiciário não apenas pela inoperância do legislativo, mas, pelo próprio endosso feito pelos congressistas para que apenas um ministro decida sobre os destinos de matérias legislativas.

Essa é uma declaração explícita da falência da política, ao transferirem o poder político, que a eles foram outorgados pelo voto, para o Judiciário.

A judicialização sugere a disputa de poder por atalhos, por regras mais baixas, ou na própria ilegalidade das decisões arbitrárias como as liminares proferidas à rodo, impedindo o exercício do poder executivo.

Como o debate mais amplo neste momento trata do equilíbrio entre os poderes, quero afirmar que tal equilíbrio se torna impossível sem a observância do que é preconizado logo no primeiro artigo da Constituição Brasileira, em seu Parágrafo Único, que diz:

Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”

Quando o poder legislativo, que seria o primeiro representante do enunciado acima, opta por transferir este poder para o judiciário, e mais ainda se direciona para atender e representar interesses específicos e setorizados dos seus financiadores de campanhas cria a deficiência no pilar do modelo democrático.

Tal preceito legal é figurativo e a sua consequência é a permanência “ad eternun” do modelo “casa grande e senzala”. Mesmo o grande avanço da nossa Constituição de 1988, chamada “Constituição cidadã”,  não avançou na quebra deste paradigma ao não contemplar as reformas estruturais na nossa sociedade.

Se criticamos o Poder Judiciário na sua elitização, mais ainda deveríamos fazer em relação ao nosso Legislativo impulsionado e condicionado, pela necessidade de cobertura das suas caríssimas campanhas, a ser mero atendente dos interesses dos seus financiadores.

Esse é o verdadeiro desequilíbrio da sociedade brasileira, onde a não observação do dispositivo legal mencionado compromete a cidadania, condição chave para o equilíbrio entre poderes, cuja história demonstra que o nosso sistema sempre retirou do cidadão a sua qualidade de sujeitos de direitos, e meros espectadores da vida política do país.

A falta de participação e controle da população nos destinos do país cria a abertura  para outras experiências de arranjos participativos e isto está causando profundas perturbações no modo como as decisões são tradicionalmente tomadas no Brasil.

A permanência dos traços característicos da nossa formação favorece o centralismo e o clientelismo observados criando a tensão entre os poderes pela disputa dos espaços que deveriam ser do cidadão, como ente originário dos processos decisórios.As nossas instituições defendem, cada vez mais, interesses muito específicos e setoriais perdendo as suas características originárias de entidades representativas do interesse público, daí a queda de braço insana entre os poderes, e mesmo dentro de cada um deles.

Para concluir, volto a afirmar que o avanço da nossa democracia não se dará sem a quebra do padrão original da nossa formação e isso só será possível com as reformas estruturais urgentes e necessárias que não se dará nem pelo ativismo judicial, nem pelas promessas, sempre travadas, feitas pelo nosso legislativo, já que estes detém o “status quo” e são os maiores representantes e guardiões do nosso  conservadorismo.

Sem uma nova Constituinte, com todos os riscos que ela possa trazer, não se avançará na quebra deste paradigma de atraso do nosso desenvolvimento.

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