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domingo, 16 de abril de 2023

Você sabe o que é ética e moral?

O que é ética?
Ética é o que diz respeito à ação quando ela é refletida, pensada. A ética preocupa-se com o certo e com o errado, mas não é um conjunto simples de normas de conduta como a moral. Ela promove um estilo de ação que procura refletir sobre o melhor modo de agir que não abale a vida em sociedade e não desrespeite a individualidade dos outros.

A ética é, portanto, a reflexão moral acerca da ação. É a ética que vai garantir às ações das pessoas a correção moral, sendo que, muitas vezes, uma ação moralmente ética pode não se enquadrar na moral de uma determinada sociedade.

Por exemplo, se, em um país que segue a lei islâmica, uma mulher comete adultério, ela pode ser condenada à morte por apedrejamento. Isso faz parte da moral daquela sociedade, mas não é eticamente correto. Se, em uma situação hipotética, alguém salva uma mulher prestes a morrer daquela maneira, essa pessoa está atentando contra a moral, mas está agindo certo, de acordo com a ética.

A ética vem da reflexão sobre as ações humanas.
A moral vem dos costumes e do sistema social.

Pela ética nos comportamos pelas compreensão que há um bem e que orienta e se manifesta a partir das nossas ações.
Pela moral nos comportamos pelo que a sociedade nos define como normas e diz o que é certo e errado.

Uma pessoa que segue rigorosamente os princípios morais de uma sociedade pode não ter nenhuma ética. Da mesma forma, para manter sua integridade ética, pode violar os princípios morais dentro de um determinado sistema de regras.

A origem da ética é universal.
A origem da moral são os costumes

Exemplos de ética:

- Respeitar as leis que sejam justas;
- Procurar agir com justiça;
- Não se apropriar, indevidamente, do que não é seu;
- Não prejudicar os outros;
- Respeitar o convívio social.

domingo, 29 de janeiro de 2023

Viviane Senna e a educação brasileira

Viviane Senna, comparou a situação do País à de um espadachim que deve travar duas lutas simultaneamente. De um lado, observou ela, a educação brasileira precisa superar desafios que já deveriam ter sido vencidos no século passado: é o caso da alfabetização das crianças e do ensino de matemática ou de pensamento lógico. De outro, as escolas têm de dar conta da formação dos alunos para o século 21. Aí entram as habilidades socioemocionais.

Não se trata, em hipótese alguma, de diminuir a ênfase nas disciplinas tradicionais. Por óbvio, é dever da escola assegurar que as crianças aprendam a ler e a escrever, a fazer contas e a raciocinar, adquirindo conhecimentos sobre a vida, a sociedade e o mundo. A questão, como bem destacou Viviane Senna, é que isso “deixou de ser a linha de chegada e agora é apenas a largada”. Ou seja, a educação tem que ir além do currículo tradicional. Não por modismo ou capricho, mas por uma imposição da realidade. Vale reproduzir um exemplo citado pela presidente do Instituto Ayrton Senna: no Japão, crianças nas turmas de educação infantil recebem brinquedos exageradamente grandes, de modo que precisem umas das outras para conseguir brincar. O objetivo, desde cedo, é estimular atitudes de colaboração.

No Brasil, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) enfatiza a importância das habilidades socioemocionais. Entre as dez competências gerais a serem desenvolvidas por todos os alunos da educação básica, há menções a “empatia”, “diálogo”, “resolução de conflitos”, “cooperação”, “respeito ao outro”, “flexibilidade” e “determinação”. A BNCC, documento que serve de referência para os currículos, preconiza também que os estudantes sejam capazes de tomar decisões a partir de “princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários”.

Fica evidente que as competências socioemocionais atendem a diferentes propósitos. Servem tanto para aumentar as chances de êxito dos jovens em sua futura carreira profissional quanto para reduzir a violência nas escolas. Ou mesmo para a construção de uma cultura de paz na sociedade, fortalecendo valores como o respeito pelo outro, algo que, infelizmente, anda em falta no País. Por ocasião do segundo turno das eleições presidenciais, colégios particulares em diferentes cidades registraram manifestações inaceitáveis de racismo, nazismo e ódio por parte de estudantes descontentes com o resultado das urnas. A esse propósito, como lembrou a colunista do Estadão Rosely Sayão, é tarefa concomitante da família e da escola contribuir para os processos de autonomia e socialização dos alunos. Maior ênfase às competências socioemocionais, nas salas de aula do Brasil inteiro, bem que poderia ajudar.

domingo, 23 de outubro de 2022

Como é a vida dentro do celular

Brasileiros usam cada vez mais o celular para comprar no e-commerce
Além disso, segundo a mesma pesquisa, o smartphone vem dominando todo o segmento do entretenimento

Do site Metrópolis 
19/10/2022

Um relatório que acaba de ser divulgado pela RankMyApp revelou que o brasileiro usa cada vez mais o smartphone para fazer compras no e-commerce. O estudo avaliou o número de downloads feitos no primeiro semestre deste ano dos aplicativos de varejo on-line, e descobriu que foram 15,7 milhões de instalações no período, representando um aumento de 2,6% em relação ao período homólogo no ano passado, quando ocorreram 15,3 milhões de downloads.

Segundo o CEO da RankMyApp, Leandro Scalise, “esses dados mostram que o brasileiro está cada vez mais habituado a utilizar o celular para realizar algum tipo de compra. É um caminho sem volta, já que pesquisas de mercado apontam que, em 2021, 54% das vendas no e-commerce vieram do mobile”.

Isso não é diferente com outros setores, e o smartphone vem dominando todo o segmento do entretenimento, com usuários preferindo usar o celular para assistir a séries e filmes na plataforma de streaming favorita e jogar em aplicativos de jogos consagrados, tanto os novos lançamentos quanto clássicos da jogatina, que já migraram para o ambiente virtual. Um exemplo são os cassinos on-line listados no cassinos.info, que contam com opções como poker e blackjack, e até mesmo as mais populares entre o público brasileiro, como bingo.

Quanto ao crescimento nos downloads de aplicativos de varejo, Scalise destaca que um dos possíveis motivos para o comportamento consumista da população são as datas comemorativas. “Com exceção a 2020, que foi um capítulo à parte por conta da chegada da pandemia, 2021 foi o ano mais forte da série histórica, com 32,2 milhões de apps baixados. Porém, 2022 deve superar em mais de 3% esse número, impulsionado por um segundo semestre com Dia das Crianças, Black Friday, Natal, além, é claro, da Copa do Mundo.”

Estudo
Para acompanhar e encontrar esses resultados, o estudo da RankMyApp ocorreu entre janeiro de 2018 e junho de 2022, e avaliou 350 milhões de dados anônimos de aquisição, assim como 283 milhões de visualizações e 70 milhões de instalações de aplicativos nas lojas Google Play e na App Store.

O CEO pontua que as informações obtidas são importantes para empresas e agências de mídia, permitindo que definam as melhores estratégias de marketing mobile para alcançar os clientes brasileiros, seja ativando clientes que já compraram, mas que se mostram inativos, seja despertando o interesse em novos clientes. “Planejamento e gestão de mídia são as chaves para o sucesso no varejo”, conclui o executivo.

De acordo com o levantamento, no último ano houve um aumento de 38% na quantidade de lojas on-line. Assim, o Brasil passou a ter 930 mil sites dedicados ao e-commerce, o que, para a RankMyApp, tem a tendência a crescer ainda mais nos próximos anos devido ao fortalecimento das plataformas móveis como geradoras de receita para o comércio eletrônico. Dessa forma, uma outra tendência é o crescimento do mobile e-commerce ou m-commerce. Para se ter noção, em 2021, mais de 54% das vendas do comércio eletrônico vieram de aparelhos móveis.

Além disso, em 2018, foram 22 milhões de downloads de aplicativos de e-commerce, enquanto em 2019 esse número subiu para 26,5 milhões. Em 2020, foram 54 milhões de apps baixados e, após uma queda em 2021, para 32,2 milhões, em 2022, só até junho, já foram 15,7 milhões de downloads, indicando que o número voltará a subir.

O chefe de marketing e vendas da empresa, Rodrigo Thedim, explica os números: “Nota-se que 2020 apresentou alta de 104% em relação a 2019, muito por conta do início da pandemia da Covid-19, período em que as pessoas não sabiam quando poderiam sair de casa novamente para ter uma vida mais próxima do normal. Já nos outros anos da série, as instalações do m-commerce vêm apresentando um crescimento sustentável, e 2022 muito provavelmente seguirá essa tendência”.

domingo, 25 de setembro de 2022

Característica do fascismo

Características do Fascismo

O fascismo é um regime de governo altamente nacionalista e autoritário que teve grande relevância na Europa no século XX.

1. Valoriza o nacionalismo exacerbado
2. Totalitarismo e Corporativismo
3. Ênfase no militarismo
4. Obsessão com a segurança nacional
5. Desprezo pelos direitos humanos
6. Desprezo por intelectuais e artistas
7. Controle da mídia e censura
8. Usa a religião como forma de  
    manipulação
9. Uso da retórica contra os métodos 
    políticos tradicionais
10. Exaltação dos “valores tradicionais” 
     em detrimento de valores  
     considerados “modernos”
11. Um modelo de Estado forte, com o 
       poder centralizado no executivo e a 
      figura do líder, incontestável.  

Características do fascismo, segundo Umberto eco:

— O culto à tradição. 
— A rejeição ao modernismo.  O Iluminismo, a Idade da Razão, é visto como o começo de toda a depravação moderna. 
— Discordância é traição.  O espírito crítico faz distinções, e isso é uma forma de modernismo. Na cultura moderna a comunidade científica elogia a discordância, como uma forma de aprimorar o conhecimento.
— Medo das diferenças. O primeiro apelo de um movimento fascista é contra os intrusos. Assim, o Fascismo Eterno é racista por definição.
— A obsessão por um enredo.
— Desprezo pelos fracos. Elitismo é um aspecto típico de qualquer ideologia reacionária.
— Machismo e armas. O Machismo implica ao mesmo tempo um desdém pelas mulheres e uma intolerância — e condenação — a hábitos sexuais fora do padrão, da castidade à homossexualidade.
— Populismo seletivo. No nosso futuro haverá o populismo de TV ou de Internet, no qual a resposta emocional de um seleto grupo de cidadãos pode ser apresentada e aceita como a Voz do Povo.

sábado, 9 de abril de 2022

‘Geração do quarto’

‘Geração do quarto’ sofre e pode fazer sofrer

emais.estadao.com.br | 6 de April de 2022

Eu sempre ouvi de psicólogos e educadores que a adolescência é uma fase em que os jovens precisam se recolher e se afastar dos pais, que isso é saudável e necessário. Por isso, quando eles se fecham no quarto e vivem em um mundo muitas vezes apartado dos adultos, a tendência é considerar esse movimento como normal. Mas existe uma linha tênue entre um recolhimento saudável e aquele que é imposto por problemas de convivência com os pais, com os amigos e com a escola, explica o educador Hugo Monteiro Ferreira, autor do livro ‘A Geração do Quarto’,  lançado essa semana pela Editora Record. O escritor, que é professor do Departamento de Educação da Universidade Federal Rural de Pernambuco, ouviu mais de 3 mil jovens, meninos e meninas entre 11 e 18 anos de cinco capitais brasileiras com o objetivo de entender essa geração. (...)

Blog: Você acha que esses jovens desabafaram sobre essa condição por não estarem conversando ‘olho no olho’ com você, o pesquisador? Conseguiram se abrir por estarem em um ambiente digital?

Hugo:  Exato. Eu acho que uma das coisas que facilitaram a minha chegada nesse grupo foi o fato de que eles não precisavam se anunciar, não precisavam dizer quem eram. Mas eu sabia que eles existiam porque eu contei com a ajuda das escolas. Para desenvolver minha pesquisa eu precisava filtrar os dados e criei alguns critérios para ter uma amostra desse universo: eu recortei 238 depoimentos de pessoas que declararam que tinham passado por bullying e por cyberbullying. Todas essas pessoas que  entrevistei posteriormente passaram por isso, tinham tentado suicídio mais de uma vez e ficavam horas e horas dentro do quarto. E eram meninos e meninas que pertenciam à classe média, o fenômeno ‘da geração do quarto’ não se dá na classe economicamente desfavorecida da forma como ele se dá na classe média. Eu tenho material ainda para analisar o que acontece com a classe menos favorecida, quais são os arranjos psíquicos que essa juventude encontra para dar conta do sofrimento psíquico, mas nesse recorte (do livro) eu foquei em jovens que são de classe média pra cima.

No livro eu digo que ‘o quarto’ é uma grande metáfora, não é necessariamente é um espaço físico em casa, o quarto pode ser a minha condição interna, porque há uma tendência muito grande na adolescência de um isolamento saudável.

Blog: (...) Como entender quando esse recolhimento esconde um sofrimento?

Hugo: Há uma tendência muito grande na adolescência de um isolamento saudável. A gente quando era adolescente gostava de ficar ali no nosso cantinho, curtindo a nossa vibe, mas necessariamente isso não significa que se sofra. O que acontece é que esse grupo sofre e esse sofrimento não é de modo geral verbalizado, mas ele é anunciado e se anuncia de forma epidêmica pela autolesão. Quando é que o adulto começa a prestar atenção no adolescente? Quando ele começa a ter nota baixa na escola. E a ‘geração do quarto’ não tem nota baixa na escola, de modo geral os boletins são ‘azuis’.

Blog: E aí, onde foi que falhamos, os pais?

Hugo: Eu acho que a gente falhou no momento em que a gente realmente não ouviu, silenciou, voltou-se pra um movimento que era mais ou menos de compensação, o ‘eu não tive, eu te dou’.

Eu acho que a gente falhou no momento em que a gente foi reconstruindo famílias, mas sem consultar quem a gente já tinha. Uma coisa que eu ouvi muito na minha pesquisa é a reclamação constante do novo movimento, ‘meu pai descasou, casou de novo, mas não me perguntou como é que eu vou ficar naquela casa, qual é o meu espaço naquela casa’. 

Eu acho que a gente falhou porque a gente também é muito frágil e a gente não procurou ajuda, também silenciou muito. (...)

Blog: Nós, os pais?

Hugo: Nós, pais, nós falhamos nisso. E quando eu digo que nós falhamos não somos nós indivíduos, mas eu acho que um sistema nos cooptou à falha. 

Por exemplo, eu entrevistei alguns pais que me disseram assim: ‘mas o que eu queria mesmo era dar futuro ao meu filho’, quer dizer, queria fazer o melhor para o filho e isso significou se ausentar muito, sair muito de perto. 

E quando chega perto se aproxima com muitas reservas, com muitas dificuldades de chegar perto. 

E às vezes para compensar tem o consumo, diz muito ‘sim’ quando poderia dizer ‘não’. Há uma fase na adolescência que eu quero ouvir ‘não’, mas muitos pais dizem muito ‘sim’. Há um certo cansaço e uma sociedade cansada gerou a geração do quarto. Então nós falhamos.
(...)

Blog: Dialoga com o mundo, pelas redes sociais e sem a mediação dos pais, né?

Hugo: Ele tá sem a mediação dos pais, está sem a ajuda da escola, sofre várias influências extremamente nocivas nas redes sociais digitais, ele tem exemplos, parâmetros muito complexos, é uma pessoa de saúde mental abalada, que precisa de ajuda.

E quando eu tenho saúde mental abalada meu jeito de funcionar é diferente de quem tem uma saúde mental mais ou menos organizada. Eu funciono buscando respostas para perguntas que ninguém me responde aqui fora e muitas vezes quem vai me dar as respostas são desafios, são jogos, são figuras que estão no submundo da internet e que me fazem acreditar que sofrem junto comigo.

É possível dizer que ‘a geração do quarto’ é aquela geração que preparou (o massacre à escola) Columbine, é aquela geração que preparou (o massacre de) Suzano, é a geração que não vai ficar em silêncio. Quer dizer, ela nunca ficou em silêncio, a gente é que não viu os sinais, não tentou parar um pouco pra ouvir.

Blog: E como que a gente se dá conta? Você disse que eles estão no quarto, mas mandam sinais. Quais são esses sinais? O silêncio deles é o primeiro sinal?

 Hugo: Pensa um menino de 11 anos que quando está em casa não vem pra sala, não vem pra cozinha, não conversa contigo, não conta as coisas, não tem dúvida, não tem questionamento, não pergunta e quando faz isso é de um modo muito violento. Pensa em um menino que é meio apático, que durante um dia de sol usa moletom de manga cumprida, coloca capuz. Pensa um menino que vive com o celular na mão, jogando. Pensa isso em casa e você ali sem nem se dar conta. Os sinais estão postos.

Blog: O que é que você sugere para os pais que começam a identificar esses sinais do filho? Qual que é o caminho para tirá-los desse recolhimento?

 Hugo: No último capítulo do meu livro eu falo sobre isso, sobre a questão da escuta. Não tem uma receita pra você tirar a ‘geração do quarto’ do quarto, talvez, no meu modo de entender, a melhor coisa a fazer seja pensar em cinco pilares, a gente tem que estruturar a recuperação a partir do que chamo de cuidado e autocuidado, autoconhecimento, convivência, diálogo e amorosidade.

Mas se eu encontro meu filho dentro do quarto se automutilando, se eu encontro meu filho ou filha dentro do quarto pensando em suicídio, falando sobre suicídio ou mesmo tentando suicídio eu preciso de ajuda profissional. Eu não posso ficar achando que eu vou dar conta, então eu tenho que recorrer a profissionais da saúde mental. A geração do quarto não tem como não ir em busca de um profissional da saúde mental, não tem. Já está adoecido, tem que ir.

Mas só profissionais da saúde mental não vão dar conta disso, tem que haver uma mudança de compreensão dentro das casas, dentro das escolas, para lidar com a potência desses meninos e dessas meninas. Você diz assim, ‘ah, mas ele é fraco, ele se corta, ele tenta suicídio’, mas ele é muito potente, esses jovens têm muita criatividade, muita dinâmica, há muita coisa a se fazer no sentido, digamos assim, de conforto emocional. Eu acho que as famílias precisam investir no que é bom da ‘geração do quarto’, eles são muito bons em muita coisa. Mas para isso eu preciso chegar perto.

Os jovens dessa geração são muito criativos, muito dinâmicos, menos racistas, menos preconceituosos, convivem mais com a pluralidade, têm uma relação com o consumo também diferente das outras gerações.  

Esses meninos precisam então de ter os pais também junto com eles no quarto. Ou seja, eu não tenho que tirar os meninos do quarto, eu preciso entrar no quarto para ver o que é que acontece dentro do quarto com eles. Eu não tenho que dicotomizar, eu não preciso me livrar do quarto, eu preciso compreender o que é que ocorre com o meu filho dentro do quarto e o porquê ele chegou ali, por que é que ele chegou naquele movimento? 

Ele não chegou sozinho, ele chegou em conjunto comigo. Quando foi que eu soltei a mão dele? Porque houve um momento em que houve esse desligamento. Pode ter sido pelo bullying que eu não vi, pode ter sido pelo cyberbullying que eu não vi, pode ter sido porque o meu menino tenha orientação sexual diferente da que eu  gostaria que ele tivesse. Onde foi que teve ali dificuldade? Precisa-se de muita escuta e de escuta sem julgamento, sem condenação, sem atirar pedras.

Blog: Você acha que o hater, o incel, ele é da ‘geração do quarto’?

Hugo: Com certeza, não tenha dúvida. Ele sofre e faz sofrer. Todo mundo que sofre, Rita, faz sofrer, não há possibilidade de sofrer sozinho. O sofrimento, ele é partilhado. Quando eu não partilho no exato momento, eu partilho doze anos depois, mas eu partilho. O sofrimento não há hipótese de ser só meu.

Blog: E o bullying e o cyberbullying, qual é o papel na geração desse sofrimento?

Hugo: O bullying talvez seja, na escola, a violência mais terrível que exista. 

Por quê? Porque o bullying é uma violência que faz com que a vítima silencie. 

E eu diria para você que o bullying é de tal forma e de tal modo perigoso que, se nós não fizermos nada, todas as crianças que são vítimas de bullying terão problemas ao longo da vida. Eu, pessoalmente, fui vítima de bullying. Eu tentei o suicídio duas vezes por conta do bullying, na minha biografia ele está presente. E o bullying mexeu comigo em todos os sentidos, mexeu com o meu modo de pensar, o meu modo de agir, de ouvir, de falar, o meu modo de ser. Eu só fui melhorar aos 40 anos de idade, eu sofri aos 12, tentei suicídio aos 13 tentando me livrar da dor profunda que o bullying tinha me provocado. 

Por quê? Porque o bullying é a destruição mais explícita da alteridade e o cyber bullying também, só que é ainda pior, sabe por quê? Porque no bullying você tem um refresco no sábado, você sofre até sexta e aquilo para, o bullying se contém no espaço físico, digamos assim. O cyberbullying você não tem refresco, são 24 horas o ataque.

Blog: Você acha que as escolas estão preparadas para o cyberbullying e para o bullying, já que o bullying é mais antigo?

Hugo: Não, não estão. Tem uma Lei brasileira, a 13.185 de 2015 sancionada pela (ex-presidenta) Dilma, e em 2016 foi criado o Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência Escolar. Em 2017, a gente fez uma retificação na Lei 9394/96, que é a Lei de Diretrizes e Base da Educação,= e nessa retificação a gente retoma a Lei 13.185 para poder dizer que é obrigatório que toda escola no Brasil tenha no seu currículo programas de prevenção ao bullying e ao cyberbullying. Ocorre que isso não é fiscalizado, então a maioria das escolas não tem esse programa, o que fazem é uma palestra uma vez, a psicóloga da escola chama os pais e conversa e tal. Isso não resolve nada porque o bullying acontece no submundo, há acordos tácitos com o bullying e quando é detectado ele já tá instalado, é só a ponta do iceberg, a coisa já tá ali fervendo.

Blog: E por que é que a maioria das escolas não tomam providências efetivas?

Hugo: Eu vou explicar a você o porquê. Geralmente quem é o agressor, o violentador, a violentadora, são grupos cognitivamente muito fortes que manipulam, são líderes escolares, então a escola fica também refém. E eles têm nuances psicopáticos também, todos os grandes agressores de bullying têm nuances psicopáticos. Então, o que acontece? Os pais, de modo geral, defendem os agressores e as vítimas se veem completamente inertes ali. E o bullying gera uma pessoa tão fragilizada que um cantinho para ela como o quarto, por exemplo, é maravilhoso. Ocorre que dentro do quarto antigamente ela ficava ali e ia tentando sobreviver. Mas agora ela tem saídas e a minha preocupação são as saídas, porque uma mente machucada pretende também machucar.

Blog: E as saídas são a internet, é isso que você tá apontando? A dark web, os grupos neonazistas, virar hater de internet.

Hugo: Exato. É isso que os haters fazem. Mas por que é que os haters fazem isso? Porque de algum modo eles já experimentaram esse mesmo veneno, então de algum modo haters são mortos-vivos que querem matar. Por isso que a empatia é muito pouco provável ser desenvolvida no hater e há uma probabilidade muito grande do psiquismo dele se associar à psicopatia. Todos os haters tem nuances psicopatas e toda vítima de bullying pode ser um planejador de extermínio. E eu sempre acho que o Coringa do Batman traduz de maneira muito lúcida, digamos assim, esse psiquismo que eu posso ter na geração do quarto. A ‘geração do quarto’ está me explicando, me dizendo, ‘olha, se as coisas continuam a caminhar por esse percurso, por esse trajeto, o que vem à frente não é lá muito saudável e pode ser extremamente bélico’. Então eu alerto os pais, as mães, as escolas, eu alerto na medida dos meus limites, por óbvio, porque fui eu que cheguei a essa conclusão. Mas eu tenho ciência também de que há muitos trabalhos que podem ajudar e há muitas pessoas interessadas em discutir essas questões, mas eu penso que o Brasil urgentemente precisa olhar para esse campo.

Matéria:

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domingo, 9 de janeiro de 2022

Quais as diferenças entre as gerações X, Y e Z

Quais as diferenças entre as gerações X, Y e Z e como administrar os conflitos?
oficinadanet.com.br | 7 de January de 2019

Comparar gerações é muito difícil se pensarmos que antigamente as gerações eram formadas a cada 25 anos, entretanto nos dias de hoje um quarto de século é praticamente um século. As coisas, as relações familiares, de trabalho, etc. mudam cada vez mais rápido. 

Consoante a isso, especialistas apontam que a criação de novas classes genealógicas estão surgindo a cada 10 anos. Estas novas classes implicam diretamente na forma de como as novas pessoas agem e consomem produtos e serviços. 

Mas o que esperar para o futuro? Como as gerações vão continuar coexistindo e como vão reagir às novas gerações que surgirão? Quais serão as características que essas gerações irão trazer e quais os conflitos que irão vir com elas?

O avanço tecnológico destas três gerações certamente não será o mesmo as próximas que estão por vir. Com a tecnologia vivendo momentos de crescimento exponencial, não podemos prever o que virá.

Cientistas afirmam que em 2045 será o ano em que as máquinas terão capacidades próprias, o que especialistas chamam de "singularidade das máquinas", onde as máquinas poderão fazer as coisas sozinhas, muito melhor e mais rapidamente que qualquer outro ser humano.

Enfim, tentaremos nesse artigo mostrar as características de cada geração, seus conflitos, (...)

Geração X

O termo Geração X - criado por Robert Capa, em 1950 - é utilizado para rotular as pessoas nascidas após o chamado "Baby Boom" (década de 20 ~ década de 40), que foi um aumento importante na taxa de natalidade dos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial. Essa geração inclui aqueles que nasceram no início de 1960 até o final dos anos 70. Por vezes são incluídos também os nascidos até 1982.

Nas palavras do escritor norte-americano John Ulrich, contemporâneo dos Baby Boomers e da geração X, este último grupo sempre foi considerada como um grupo de pessoas jovens, sem identidade aparente, que enfrentariam um mal incerto, sem definição, um futuro hostil. Um futuro pós-guerra, um tempo de incertezas e de guerra fria, de polarização entre o bem e o mal, entre Estados Unidos da América e União Soviética.

Acontece que a geração X cresceu, passou pela fase hippie, teve ideais, esqueceu-se dos mesmos e foi fazer carreira no mercado. Viu surgir computador pessoal, a internet, o celular, a impressora, o e-mail, etc. e viu seu mundo mudar muito. Grande parte da Geração X chegou aos 30, 40 anos e descobriu que para juntar meio milhão e dar entrada, com sorte, num apartamento modesto que irá pagar até seus 60 anos, o caminho é longo e o preço é alto, bem alto, às vezes impagável. À sua volta os filhos crescem, os pais morrem, os sonhos envelhecem e as férias exóticas para a Finlândia, Marrocos ou Jamaica nunca são tiradas.

Hoje, é cada vez mais comum ver estes profissionais "Chutando o balde", pela internet, inclusive, há vários blogs e canais do YouTube de profissionais até então bem sucedidos, com cargos muito bem remunerados e carreiras consolidados, de mais de 10 anos, em uma grande multinacional que largam tudo para pintar quadros, estudar fotografia, gastronomia, etc. aquilo que os fazem felizes.
Aqui neste projeto você pode conferir várias histórias de pessoas que largaram tudo para corre atrás dos sonhos, grade parte deles são integrantes da geração X, com mais de 30 anos e às vezes, bem mais.

Geração Y

Compreendendo aqueles que nasceram em fins dos anos 70 e início dos anos 90, a geração Y, representava, em 2012, cerca de 20% da população global, segundo Afonso Borges, em seu livro "Social Target".

Foi a geração que desenvolveu-se em uma época de grandes avanços tecnológicos e prosperidade econômica. As crianças da geração Y cresceram tendo o que muitos de seus pais não tiveram, como TV a cabo, videogames, computadores, vários tipos de jogos, e muito mais. Se a geração X viu nascer a internet e a tecnologia, a geração Y já nasceu quando as mesmas estavam plenamente desenvolvidas, cresceram e internalizaram as mesmas desde pequenos.

Segundo pesquisadores que estudam as gerações, a geração Y cresceu rodeada de facilidades oferecidas por seus pais, que obviamente queriam dar uma vida melhor do que aquela que tiveram, para seus filhos. Eles cresceram vivendo em ação, estimulados por atividades, fazendo tarefas múltiplas. Acostumados a conseguirem o que querem, não se sujeitam às tarefas subalternas de início de carreira e por isso lutam por salários ambiciosos desde cedo. É comum que os jovens dessa geração troquem de emprego com frequência em busca de oportunidades que ofereçam maiores desafios e crescimento profissional.

Se você é da geração Y, cresceu num mundo digital e a Internet é, para você, uma necessidade essencial - afinal, responda-me: Quanto tempo consegue ficar sem ela sem sofrer com a abstinência? - e com base no seu acesso facilitado, desenvolveu uma grande capacidade em estabelecer e manter relações pessoais próximas, ainda que à distância.

A tecnologia e os dispositivos móveis permitiram a comunicação entre si como nenhuma outra geração o tinha feito anteriormente, permitindo partilhar experiências, trocar impressões, comparar, aconselhar e criar e divulgar conteúdos, que são o fundamento das redes sociais. Preocupados com o meio ambiente e as causas sociais, têm um ponto de vista diferente das gerações anteriores, que viveram épocas de guerras e desemprego.

Jovens desta geração têm como hábito ser tão multitarefa quanto seu smartphone, podendo, ao mesmo tempo trabalhar em mais de 1 projeto, responder e-mails, acompanhar as notícias através de algum site, conversar com os colegas de trabalho, conversar com os amigos online, ouvir música e dar atenção às redes sociais. 

Geração Z

Essa geração, que compreende os nascidos entre o fim de 1992 a 2010, está ligada intimamente à expansão exponencial da internet e dos aparelhos tecnológicos. As pessoas da Geração Z são conhecidas por serem "nativas digitais", estando muito familiarizadas com a World Wide Web, com o compartilhamento de arquivos, com os smartphones, tablets, e o melhor de tudo: Sempre conectadas.
Se pensarmos um pouco, vamos perceber que integrantes desta geração nunca viram o mundo sem computador. Outra característica essencial dessa geração é o conceito de mundo que possui, desapegado das fronteiras geográficas. Para eles, a globalização não foi um valor adquirido no meio da vida a um custo elevado. Aprenderam a conviver com ela já na infância. Como informação não lhes falta, estão um passo à frente dos mais velhos, concentrados em adaptar-se aos novos tempos.

Os maiores problemas dessa geração são relacionados à interação social. Paradoxalmente, por estarem tão conectados virtualmente, muitos deles sofrem com a falta de intimidade com a comunicação verbal, o que acaba por causar diversos problemas com as outras gerações. Segundo alguns analistas, essa Geração também é marcada pela ausência da capacidade de ser ouvinte.

A Geração Z é um tanto quanto desconfiada quando o assunto é carreira de sucesso e estudos formais, a maioria já não acredita mais em fazer uma só coisa para o resto da vida ou passar sua vida profissional inteira em uma só empresa. Muitos da geração Z, inclusive, trabalham de casa, é o chamado Home Office, seja em um emprego formal em uma empresa liberal ou informalmente, ganhando dinheiro com blogs, mídia, venda de anúncios YouTube, publicidade, etc. Segundo especialistas, poderá haver uma "escassez" de médicos e cientistas no mundo pós-2020 justamente por isso.

Enfim, essa geração tem um grande problema, segundo as demais: É a geração mais fechada de todas, onde cada um está sempre fechado em seu mundo e isolado através de fones de ouvido (seja em ônibus, universidades, em casa, no ambiente de trabalho...). São os que escutam pouco e falam menos ainda. Pelos demais eles podem ser definidos como a geração que tende ao egocentrismo, preocupando-se somente consigo mesmo na maioria das vezes. Para os mais antigos pode parecer que houve uma mecanização do "pessoal do escritório".

Artigo completo:
https://www.oficinadanet.com.br/post/13498-quais-as-diferencas-entre-as-geracoes-x-y-e-z-e-como-administrar-os-conflitos?utm_source=pocket_mylist

sábado, 1 de janeiro de 2022

Esperançar, o Brasil precisa de Paulo Freire.

Não é difícil entender por que Freire desperta ódio e, sobretudo, medo em quem quer um povo calado. Sua pedagogia valoriza a experiência dos que sempre foram pisoteados. Recupera o saber onde a sociedade só vê ignorância. Dá protagonismo a quem foi treinado a só obedecer. Revela que nenhuma opressão é natural e que nada é impossível de mudar. É uma educação para a liberdade.

Seu método dialógico mostra que ninguém é detentor do saber absoluto. O educador aprende ao ensinar e o educando ensina ao aprender. A educação é um ato de amor, porque envolve troca. Isso é uma punhalada na lógica de uma sociedade que naturaliza a desigualdade e a opressão. Por isso Seu Paulo é tão perigoso. Por isso foi perseguido e exilado pela ditadura militar e é hoje atacado violentamente pelos bolsonaristas, os mesmos que dizem que a universidade não pode ser para todos ou que o Brasil tem professores demais.

Além de uma pedagogia revolucionária, reconhecida em todo o mundo, Paulo Freire nos legou um verbo: esperançar. Dizia que a esperança de que precisamos não vem de "esperar", passivo e quieto. Vem de "esperançar", daqueles que sonham com um mundo melhor e agem para que se realize. O Brasil, mais que nunca, precisa esperançar. Precisa de Paulo Freire.

Texto extraído da Folha de São Paulo.

domingo, 26 de dezembro de 2021

O Mito Da Caverna

"Mito da Caverna"
Descrito no livro A República, capítulo 6, do filósofo Platão.

Platão utilizou a linguagem alegórica para mostrar o quanto os homens estavam presos a imagens, sombras ou preconceitos e superstições, como correntes ligadas aos seus corpos.

Para descrever isso, ele remete à imagem de um grupo de homens que nasceram e cresceram dentro de uma caverna, imobilizados por correntes e obrigados a olhar apenas para a parede da caverna à sua frente. Ali, acorrentados e totalmente acostumados com esta situação, contemplavam o que achavam ser o mundo, a partir apenas das sombras refletidas no fundo da caverna por uma escassa luz que havia atrás deles.

O seu mundo ‘real’ era formado por sombras de estatuetas de homens, de animais, vasos, bacias e outros vasilhames, refletidas na parede da caverna. Como só podiam enxergar essas imagens distorcidas, concluíam que eram verdadeiras. A existência desses prisioneiros era inteiramente dominada pela ignorância e contentamento com o que é superficial.

Quebrando as correntes

Certo dia, um dos prisioneiros resolveu libertar-se e voltar-se para o lado de fora da caverna. No início, ao sair da caverna e das trevas que ali reinavam, ficou cego devido à claridade vinda de fora. Gradativamente, seus olhos foram se acostumando à claridade e vislumbraram um outro mundo, com natureza, cores, “imagens” diferentes do que antes considerada verdadeiro. O universo da ciência (gnose) e o do conhecimento (episteme), por inteiro, se abria perante ele, podendo então vislumbrar o mundo das formas perfeitas ou o mundo da verdade, do conhecimento verdadeiro. Maravilhado com o conhecimento, ele voltou para dentro da caverna para narrar o fato aos seus amigos ainda acorrentados, com o intuito de também libertá-los, mas eles não acreditaram nele e revoltados com a sua “mentira”, acostumados a permanecerem na “zona de conforto”, ameaçaram matá-lo.

Com essa alegoria, Platão divide o mundo em duas realidades: o sensível, que é percebido pelos cinco sentidos, e o inteligível (o mundo das ideias), que se alcança apenas com a racionalidade, o pensamento puro, livre das 'trapaças' dos sentidos. O primeiro é o mundo da imperfeição, da ilusão, da mera opinião, do “eu acho”. O segundo é o mundo da verdade, do conhecimento, das ideias, das formas inteligíveis e perfeitas, dos conceitos, do “eu sei”.

A mensagem de Platão ao mundo atual é que o ser humano deveria procurar as verdades em si, sem se contentar com as meras opiniões ou preconceitos.

O homem deveria se empenhar em uma atitude de investigação, pesquisa, discernimento, aprofundamento, problematização, criticidade, enfim, se empenhar na atitude filosófica, para que consiga atingir o bem maior para sua vida, que só pode ser decorrência da verdade ou, pelo menos, da busca sincera e incessante por ele.

No dia a dia, muitas são as cavernas em que nos envolvemos e nos encontramos, seja por comodismo ou alienação, e encontramo-nos enganados e submersos, sem nos darmos conta de que tudo é mera especulação ou ilusão. Assim, O Mito da Caverna, e a filosofia como um todo, é um convite permanente à reflexão e à vida digna.

Richard Garcia é professor de Filosofia, Sociologia e Atualidades do Percurso Pré-vestibular e Enem.

https://www.em.com.br/app/noticia/especiais/educacao/enem/2015/08/03/noticia-especial-enem,674644/platao-e-o-mito-da-caverna.shtml.

domingo, 28 de novembro de 2021

Música e a geração da 'audição ansiosa'.

Geração da 'audição ansiosa' faz músicas ficarem menores e mais 'objetivas'
cultura.estadao.com.br | 7 de November de 2021 

Existe uma nova ordem no reino dos hits da música pop, e ela está sendo ditada pelos ouvintes de streaming, os consumidores de faixas disponíveis em plataformas como Spotify, Deezer e Amazon Music. Algo que já começa a ser chamado de “audição ansiosa” tem definido parâmetros do que seria um novo sucesso nas duas ou três pontas do processo. O compositor precisa pensar em canções com menor tempo de duração; o produtor tem de fazer com que tudo seja mais direto e funcional para que o ouvinte não vá embora e a própria plataforma deve responder rápido à nova demanda do ouvinte que ajudou a criar.

Uma boa produção feita em 2021 – e por boa entenda algo capaz de atrair milhares de ouvintes que não abandonem a faixa nos primeiros segundos (...) precisa, em resumo, ser objetiva e curta. Isso porque esse ouvinte que cresceu com o streaming não ouve, segundo as estimativas das próprias plataformas, músicas com mais do que dois minutos e 30 segundos de duração. Essa é a média. Se chegar a três, temos uma vitória digna de Grammy.

Mas, o que são músicas objetivas? Aqui é preciso ouvir os produtores, figuras que se tornam tão ou mais importantes do que o próprio compositor: mediadores que transformam canções do novo e do velho mundo em possíveis potências de compartilhamento jogando no novo tabuleiro. Dani Brasil é um deles. DJ renomado nos Estados Unidos, com residências em Atlanta, Washington, Miami, Chicago e Nova York, é um nome forte da tribal house que, ao lado de Rafael Dutra, recondicionou o hit The Best, de Tina Turner, para milhares de ouvintes. “Antes, podíamos contar uma história, criar uma narrativa. Havia uma introdução, uma melodia crescente, um auge. Mas, hoje, as pessoas não têm mais paciência. As mensagens devem ser diretas, o impacto precisa estar logo no início.” Se isso é ruim? “O meu interesse é ter plays, quero que o ouvinte não vá embora e vou fazer de tudo para que ele fique.”

Outro nome da produção estelar, o carioca Tiago da Cal Alves, o Papatinho, DJ, beatmaker e produtor autodidata, viu tudo mudar desde que ajudou o grupo de rap ConeCrewDiretoria a acontecer, nos anos de 2010, e agora, quando já colaborou com Marcelo D2, Seu Jorge, Criolo, Black Alien e produziu Anitta nas faixas Tá com o Papato (1.830.652 visualizações no YouTube) e Onda Diferente, incluindo um feat (colaboração) com o rapper Snoop Dogg e Ludmilla (104.788.020 visualizações). Por suas constatações, o mundo musical não é mais da década de 2010.

“Além das facilidades do streaming, a geração nova é bombardeada por informações rápidas ao mesmo tempo. Stories são de 15 segundos, músicas para o TikTok têm um minuto, o Twitter aceita pouco texto. Se sua música não for direto ao ponto, você perde esse ouvinte.” E ele sente que o encurtamento do discurso musical ainda não terminou. “A tendência é diminuir mais.” 
(...)
Matéria reduzida para fazer as pessoas lerem.
Segue o link da matéria completa:

https://cultura.estadao.com.br/noticias/musica,geracao-da-audicao-ansiosa-faz-musicas-ficarem-menores-e-mais-objetivas,70003890862?utm_source=pocket_mylist

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Quem tem medo de Paulo Freire?


Quem tem medo de Paulo Freire?
folha.uol.com.br | 19 de September de 2021

Foi um privilégio frequentar, em 1982, o curso que Paulo Freire, recém-chegado do exílio, ministrava na pós-graduação da PUC-SP; e ousado foi me candidatar à função de secretária quando o mestre comentou, em sala de aula, que procurava pessoa que o ajudasse a administrar sua correspondência.

Como aluna, compreendi o valor de uma abordagem que foca o educando em sua relação dialógica com o educador e como sujeito de sua aprendizagem, aprendizagem das letras e da ciência, mas também do ser no mundo e na história.

Adicionalmente, como secretária de Paulo Freire por cinco anos, experimentei um sentimento de perplexidade por lidar mensalmente com centenas de cartas (provenientes de países tão distintos como EUA, Inglaterra, Angola, Suécia, Índia, França, Austrália, Palestina ou Uruguai), que traziam as mais variadas solicitações, consultas e convites, cartas assinadas por renomados intelectuais, reitores de prestigiadas universidades, professores universitários e de todos os outros níveis, estudantes, líderes comunitários etc. Esse assombro se estendia a outros aspectos. Por exemplo, me surpreendia como uma figura de tal status podia se relacionar com tanta simplicidade e empatia com qualquer pessoa que dela se acercasse.

Outras questões se colocavam: por que um professor, armado apenas de giz e de palavras que expressavam um pensamento profundamente humanista e com evidente influência cristã, incomodava tanto o governo militar? Qual a razão das ameaças que obrigaram o mestre a se exilar para proteger a si e a família? A resposta estava dada e, infelizmente, ainda é válida: um educador, que ajude o aluno a compreender-se como protagonista de sua própria história, da história de sua comunidade e de seu país, será sempre considerado um perigo por quem pretende calar a voz daqueles que nunca tiveram vez nas dinâmicas de poder do Estado e da sociedade.

Com a debacle da ditadura, pensou-se que as tentativas de suprimir a concepção freiriana da educação estariam definitivamente enterradas. Mas nova perplexidade nos aguardava.

No final dos anos 1980 e na década seguinte, a abordagem educacional de Freire, extremamente valorizada no exterior, sofria aqui críticas de intelectuais que abraçaram uma concepção utilitarista da educação, concepção divulgada em documentos do Banco Mundial. Como aquela instituição financiava reformas educacionais aqui e em diversos países, ficou clara a vinculação entre os projetos governamentais daquele período e o poder econômico da instituição financeira. O aspecto farsesco do processo foi a tentativa de atribuir os baixos índices de aprendizagem de todo o sistema de ensino a uma suposta predominância de método freiriano nas escolas públicas.

Pesquisadores rigorosos rebateram essa falsa associação, divulgando dados e desenvolvendo sólidos argumentos para demonstrar que a adesão a Freire era (e é) absolutamente minoritária no conjunto das escolas públicas, uma vez que a metodologia exige formação sólida e tempo para um trabalho docente centrado em profundo conhecimento das condições de vida do educando.

Como pôr em prática tal metodologia em um sistema em que professores, exercendo profissão de baixo status social porque mal paga, circulam por duas ou mais escolas, enfrentando salas superlotadas, sem tempo até para aprender o nome de todos os alunos? Pesquisas sempre demonstraram que, na maioria absoluta das escolas públicas, vigora o ensino tradicional, em que o estudante, na melhor das hipóteses, apenas reproduz mecanicamente o conhecimento veiculado, sem conseguir compreender o significado ou a importância dos conteúdos escolares para sua vida cotidiana ou para seu futuro.

Neste domingo (19), dia de comemoração do centenário do patrono da educação brasileira, é desalentador registrar que, novamente, esferas oficiais estão tentando apagar a extraordinária contribuição de Paulo Freire para projetos de desenvolvimento integral dos educandos. Entretanto, como nas tentativas anteriores, o vigor das ideias freirianas prevalecerá, inspirando, aqui e em todo mundo, educadores que acreditam na força de uma educação humanista, inclusiva, e, portanto, emancipadora.

sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Imperdíveis frases de Paulo Freire

"O estudante precisa aprender a ler o 
mundo para poder transformá-lo."
Paulo Freire

"Enquanto presença na História e no
mundo, esperançadamente luto pelo
sonho, pela utopia, pela esperança."
Paulo Freire

"Como professor não me é possível
ajudar o educando a superar sua
ignorância se não supero
permanentemente a minha".
Paulo Freire

"Se nossa opção é progressista, se
estamos a favor da vida e não da morte,
da equidade e não da injustiça, do direito
e não do arbítrio, da convivência com o
diferente e não de sua negação, não
temos outro caminho senão viver
plenamente a nossa opção."
Paulo Freire

"É preciso ousar, aprender a ousar, para
dizer NÃO a burocratização da mente a
que nos expomos diariamente".
Paulo Freire

"O conhecimento exige uma presença
curiosa do sujeito em face do mundo.
Requer uma ação transformadora sobre
a realidade. Demanda uma busca
constante. Implica em invenção e em
reinvenção".
Paulo Freire

"Estudar exige disciplina. Estudar não é
fácil. porque estudar pressupõe criar,
recriar, e não apenas repetir o que os
outros dizem."
Paulo Freire

"A educação necessita tanto de formação
técnica e científica como de sonhos e
utopias".
Paulo Freire

"Ler não é caminhar sobre as palavras.
Ler é reescrever o que estamos lendo, é
perceber a conexão entre o texto e o
contexto e como vincular com o meu
contexto."
Paulo Freire

"Num mundo a que faltasse a liberdade e 
tudo se achasse preestabelecido, não
seria possível falar em esperança.”
Paulo Freire

“Não há criatividade humana, não há
produção humana, não há mudança de
mundo, sem se correr risco.”
Paulo Freire

"Precisamos contribuir para criar a Escola
que é aventura que marca, que não tem
medo do risco, por isso recusa o
imobilismo."
Paulo Freire

“Ensinar não é transferir conhecimento,
mas criar as possibilidade para a sua
própria produção ou a sua construção”
Paulo Freire

"A educação problematizadora está
fundamentada sobre a criatividade e
estimula uma ação e uma reflexão
verdadeiras."
Paulo Freire

“Como professores, educadores, nós
temos que estar engajados num palco de
luta permanente, que é a luta pela
superação. É preciso estarmos abertos
constantemente ao novo e ao diferente,
para poder crescer e aprender.”
Paulo Freire

”Só uma educação da pergunta aguça,
estimula e reforça a curiosidade. A
educação da resposta não ajuda em
nada a curiosidade, indispensável ao
processo cognitivo."
Paulo Freire

"O mundo não é, o mundo está sendo".
Paulo Freire

"O homem, ser de relações, e não só de
contatos, não apenas está no mundo,
mas com o mundo"
Paulo Freire

"É porque eu amo o mundo que luto para
que a justiça social venha antes da 
caridade"
Paulo Freire

"Educação não transforma o mundo.
Educação muda pessoas. Pessoas
transformam o mundo".
Paulo Freire

"Não há saber mais, nem saber menos, há
saberes diferentes"
Paulo Freire

"A educação tem caráter permanente.
Não há seres educados e não educados.
Estamos todos nos educando."
Paulo Freire

“A educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem. Não pode temer o debate. A análise da realidade. Não pode fugir à discussão criadora, sob pena de ser uma farsa."
Paulo Freire

"É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal maneira que num dado momento a tua fala seja a tua prática."
Paulo Freire

"É preciso ousar para jamais dicotomizar
o cognitivo do emocional."
Paulo Freire

"Nao deixe que o medo do difícil paralise
você."
Paulo Freire

"Sem a curiosidade que me move, que me
inquieta, que me insere na busca, não
aprendo nem ensino".
Paulo Freire

"A prática educativa é tudo isso: afetividade, alegria, capacidade científica, domínio técnico à serviço da mudança ou lamentavelmente, da permanência do hoje."
Paulo Freire

quarta-feira, 17 de julho de 2019

Comunicação em rede e nova política no Brasil

Hoje, no Brasil, há pessoas que dizem que o nazismo era de esquerda, que as vacinas são ruins e que a terra é plana. Como isso é possível na era da informação?

Primeiro, as pessoas não funcionam racionalmente e sim a partir de emoções.As pesquisas mostram cientificamente que a matriz do comportamento é emocional e, depois, utilizamos nossa capacidade racional para racionalizar o que queremos. As pessoas não leem os jornais ou veem o noticiário para se informar, mas para se confirmar. Leem ou assistem o que sabem que vão concordar. Não vão ler algo de outra orientação cultural, ideológica ou política. A segunda razão para esse comportamento é que vivemos em uma sociedade de informação desinformada. Temos mais informação do que nunca, mas a capacidade de processá-la e entendê-la depende da educação e ela, em geral, mas particulamente no Brasil, está em muito mau estado. E vai ficar pior, porque o próprio presidente acha que a educação não serve e vai cortar os investimentos na área. Por um lado, temos mundos de redes de informação, de meios que invadem o conjunto de nosso pensamento coletivo, e ao mesmo tempo pouca capacidade de educação das pessoas para entender, processar, decidir e deliberar. Isso é o que chamo de uma era da informação desinformada.
As universidades públicas e os professores brasileiros estão sob ataque?

Vocês estão vivendo um novo tipo de ditadura. As instituições estão preservadas, mas se manipulam tanto por poderes econômicos, quanto por poderes ideológicos. O Brasil, nesse momento, perdeu a influência da Igreja Católica que foi muito tradicional durante muito tempo na História, mas ganhou algo muito pior que são as igrejas evangélicas, para quem claramente não importa a ciência e a educação, porque quanto mais educadas e informadas estejam as pessoas, mais capacidade terão de resistir à doutrinação. O mesmo acontece com o presidente (Bolsonaro) e com o regime que está instalando. Não se pode fazer uma ditadura antiga, que se imponha com o exército, mas uma ditadura Orwelliana, de ocupar as mentes. Isso se faz acusando de corrupção qualquer tipo de oposição. Como a corrupção está em toda parte, então persegue-se apenas a corrupção de políticos e personalidades que se oponham ao regime. Esse tipo de ditadura só pode funcionar com um povo cada vez menos educado e mais submetido à manipulação ideológica.

Como essa manipulação é exercida?

Nosso mundo da informação é um mundo baseado nas redes sociais e nas redes sociais há de tudo. Elas permitem a autonomia dos indivíduos, acreditávamos que era um instrumento de liberdade e é, mas é uma liberdade que é usada tanto pelos manipuladores como pelos jovens que tentam mudar o mundo. Foram desenvolvidas técnicas muito poderosas de desinformação e manipulação, que incluem a utilização massiva de robôs manipulados por organizações como o Movimento Brasil Livre (MBL) e financiadas pela extrema direita internacional, que estão preenchendo as redes sociais e manipulando-as muito inteligentemente, de forma que a construção coletiva do que ocorre na sociedade está totalmente dominada por movimentos totalitários, que querem ir pouco a pouco anulando a democracia. Por isso, é preciso atacar a educação, atacar os professores, as universidades, as humanidades e as ciências sociais, que são áreas que nos permitem pensar. Tudo o que significa pensar é perigoso. Por isso, digo que é uma ditadura, ainda que de novo tipo. É uma ditadura da era da informação.

O que as escolas brasileiras precisam ter para mudar a realidade do país?

Primeiro: recursos. Mesmo que haja mudanças na pedagogia, se não há recursos, se não pagam e não respeitam os professores e se não há menos alunos por classe, (não adianta). É preciso uma formação inicial melhor dos professores e também uma reciclagem contínua, sobretudo, nas escolas mais longínquas do Brasil. Precisamos de bons professores imediatamente, não podemos esperar vinte anos para produzir os educadores que vão educar os jovens. E como fazer isso? Com educação virtual a distância. Precisamos reforçar as universidades virtuais, fazer com que haja programas de formação virtual, mas não de segunda categoria. Estou na Universidade Aberta da Catalunha, que tem 65 mil estudantes 100% na internet, e funciona muito bem. Os estudantes de lá têm os mesmos diplomas que os demais e não há nenhuma diferença de qualidade e nem de mercado para eles.

Você falou muito sobre a importância da valorização do professor. Atualmente, o professor mais conhecido do país, Paulo Freire, está sendo alvo de ataques.

Isso significa que tudo que é criação de uma cidadania informada, educada e autônoma, é um perigo para uma ditadura sutil, que precisa de pessoas que não sejam bem educadas, que sejam desinformadas e manipuláveis. Os três princípios de Paulo Freire são: aprender pela experiência— hoje em dia encontramos tudo na internet, há possibilidade de fazer grupos de aprendizagem na internet—, autonomia dos alunos para educar-se para buscar a informação, e professores para guiá-los. Agora que temos tecnologia, não só internet, mas as conexões rápidas, é possível revolucionar facilmente a escola seguindo os princípios de Paulo Freire. Por que se ataca Paulo Freire? Porque no mundo, e não só no Brasil, ele é um símbolo. Eu conheci Paulo Freire na Universidade Stanford e lá ele era adorado, porque seus princípios são adaptados ao que é a nova sociedade: criar pessoas livres e autônomas, capazes de promover sua própria aprendizagem, guiados por seus professores. Isso é muito perigoso para aqueles que querem manipular. Paulo Freire é liberdade, e a liberdade é agora o maior obstáculo que existe para que se siga desenvolvendo essa ditadura sutil que estão tentando impor ao Brasil.

O governo anunciou recentemente que pretende criar mais de 100 novas escolas militares, com uma forte disciplina. Qual sua opinião sobre essa iniciativa?

A autonomia é fundamental. O que precisamos hoje é de pessoas educadas para pensar autonomamente, porque há uma quantidade de informação tão grande que precisamos ser autônomos em construir nossas opiniões e tomar decisões. Hoje em dia, existem robôs cada vez mais avançados, e as escolas não podem ser produtoras de robôs. (A formação de) gente que simplesmente obedece, segue o que está programado e aceita tudo é um princípio de militarização não só da escola, mas da sociedade. A grande questão do Brasil nesse momento é que se não houver uma grande reação da sociedade contra essas medidas que chamo de uma ditadura de novo formato, o Brasil será transformado em uma sociedade totalitária.

Na sua opinião, qual o papel das redes sociais na eleição de Jair Bolsonaro?

Foi um papel fundamental. Bolsonaro é um pensamento totalitário, mas ele foi eleito democraticamente. Portanto, a grande pergunta é: por que uma maioria clara dos brasileiros elegeu Bolsonaro? Uma coisa é a democracia e outra são os resultados da democracia. Hitler foi eleito democraticamente.Tenho tentado dar uma resposta sobre isso não só para o Brasil, mas para o mundo, porque aconteceu o mesmo em outros lugares, como (Donald) Trump (nos Estados Unidos). O que mostro é que as pessoas em todo o mundo já não acreditam na classe política, nos partidos, nas formas do que chamávamos de democracia liberal, porque elas se corromperam. Os políticos se apropriaram da democracia e do Estado para eles mesmos. A confiança entre governantes e governados se rompeu. Então, qualquer pessoa com capacidade de mobilização e de carisma, apoiado por recursos econômicos muito importantes dos grupos poderosos de sempre — que temem que as pessoas sejam capazes de controlar suas próprias vidas e não se deixem manipular e explorar— formam a combinação (que leva a isso).Então surgem demagogos como Trump e Bolsonaro. A narrativa está sendo controlada nas redes sociais pela extrema direita e por movimentos totalitários, muitos deles de cunho religioso.

A esquerda já perdeu essa batalha nas redes?

Essa esquerda sim. Essa esquerda está morta. Toda a democracia liberal está morta e não só no Brasil. No resto do mundo, o pouco que resta da esquerda está tentando se reestruturar. Agora, a esquerda não é simplesmente uma ideologia, alguns partidos. O que chamamos de esquerda é a capacidade das pessoas de se rebelarem contra sua exploração, sua manipulação, e sua opressão. Então, se falamos da esquerda existente hoje, ela está em colapso total, mas se falamos da possibilidade de uma rebelião, de um controle social contra o que está acontecendo. Posso garantir, pela experiência história do Brasil que haverá mais que uma esquerda, haverá grandes movimentos sociais contra a ditadura, como houve para acabar com a ditadura anterior.

Hoje, temos uma difusão enorme de notícias falsas. Há precedentes na História?

Nunca tivemos tanta difusão de informação, mas os chamados "rumores" sempre foram fundamentais. Os "mitos". Pessoas foram perseguidas, mulheres foram queimadas por histórias de que eram bruxas e participavam de atos com o demônio. Tudo isso é fake news. A História está cheia de fake news fundamentais para mobilizar os comportamentos mais extremos e irracionais, mas o que acontece é que agora como há uma capacidade muito maior de difusão da informação, muito mais intervenção de todos nessas redes, não apenas dos poderes de sempre, a densidade é muito maior. As pessoas que querem estabelecer a verdade, a honestidade e os valores fundamentais humanos têm que intervir nas redes sociais, porque hoje em dia os que fazem isso são, sobretudo, os destruidores da Humanidade.

Manuel Castells,
Referência no estudo de comunicação e comunicação em redes.

No jornal O Globo

sábado, 13 de julho de 2019

Educar para o respeito, não para a obediência ou o medo

Pode surpreendê-lo, mas uma criança obediente não é uma criança feliz. Obediência é quase sempre alcançada através do medo, então o melhor é educar para que eles entendam imediatamente o que respeito, reciprocidade e empatia são construídos através do afeto sincero.

Certamente alguns pais não concordarão. De fato, muitos de nós fomos educados de acordo com as regras da psicologia comportamental que fazer algo errado envolve receber uma punição severa e, ao contrário, fazer a coisa certa leva a uma recompensa.

Prêmios e punições nem sempre são eficazes, especialmente porque no mundo adulto a sociedade nem sempre nos recompensa por “se comportar bem”. As crianças não devem direcionar seu comportamento com base em gratificações simples.

Em vez disso, elas precisam entender por si mesmos a base do bom comportamento, respeito e nobreza da alma, colocando-os em prática espontaneamente.

Obediência baseada no medo e infelicidade

Começamos esclarecendo os conceitos mais importantes. Obediência transmitida através do medo é uma fonte de desconforto em uma criança; Da mesma forma, porém, também a permissividade causa infelicidade. Em um caso, a criança só verá paredes ao seu redor; no outro, sem ver ninguém, ela nunca saberá o que esperar.

Os extremos não funcionam quando uma criança é criada. Portanto, é melhor definir o que se entende por “criança obediente”.

Crianças obedientes só em casa
Esse é um comportamento tipicamente observado nas escolas. Mestres e professores percebem crianças que se comportam violentamente na sala de aula e não respeitam os outros, mostrando uma atitude muito diferente do que fazem em casa.

Quando os professores falam sobre isso com seus pais, estes não conseguem imaginar ou acreditar que seus filhos se comportam assim porque em casa “são muito obedientes”.

O problema é o seguinte: quando educamos através do medo e da punição, as crianças obedecem, mas não conseguem aprofundar o conceito de respeito. Ela faz o que faz porque é obrigada, mas não o entende. É por isso que na escola, sentindo-se mais livres das pressões familiares, ela tende a canalizar o medo e a raiva através dessas ações destrutivas.

Não é a coisa certa a fazer. Às vezes podemos até testemunhar a situação oposta; Crianças severamente educadas através da obediência em outras ocasiões mostram uma atitude fechada, medrosa e defensiva. O medo não as educa, pelo contrário, prejudica seu equilíbrio emocional.

As maneiras pelas quais crianças obedientes são educadas

Há muitas maneiras de educar uma criança e cada família terá seus próprios princípios, valores e estratégias para transmitir a seus filhos. Em qualquer caso, a obediência baseada na submissão não é saudável ou pedagógica.

Vejamos os riscos deste tipo de educação dominante e rigorosa baseada na obediência:

• As crianças não sabem ou se atrevem a expressar suas emoções porque qualquer ato espontâneo é punido.

• A criança que é educada para ficar em silêncio, para esconder as lágrimas porque “chora é para os fracos” ou para ficar calma porque “para não incomodar” vai acabar desenvolvendo uma repressão emocional e pessoal muito perigosa.

• Obediência também visa “proteger” a criança de possíveis ameaças. Uma criança obediente nunca sairá da zona de conforto familiar e ficará presa dentro dessa “bolha” paterna e materna.

• A criança obediente educada no medo não tem a coragem de explorar ou descobrir, ela não se sente segura para se abrir com os outros. O medo é o oposto da felicidade. Portanto, é necessário mudar a estratégia, educar para o respeito e não para o medo.

Educar para o respeito, educar para a felicidade

Não é a mesma coisa dizer “cale a boca e pronto, você está incomodando” e dizer “você pode ficar quieto agora, por favor? Mamãe está no telefone “.

A educação e a atitude da linguagem são pedagógicas: servir como modelo é a chave para a educação de uma criança. Se é verdade que todos nós queremos que nossos filhos nos escutem, também é verdade que eles devem entender por que as coisas são melhores assim, por que devem se comportar respeitosamente com os outros.

Tome nota destas ideias-chave para refletir sobre o valor da educação baseada no respeito:

• Dê responsabilidades ao seu filho. Ele deve entender desde cedo a importância de fazer as coisas sozinho e cuidar de seus objetos pessoais. Pouco a pouco, ele perceberá que é capaz disso e que confiamos nele e nos orgulharemos disso.

• Debata com ele sobre as regras que você estabelece em casa. Explique por que ele deve observá-las; Desta forma, estabelecemos uma comunicação baseada no respeito através da qual você pode responder a todas as suas perguntas.

• Se ele fizer algo errado, não grite ou o humilhe (com expressões como “você é estúpido” ou “você é o pior filho do mundo”). Em vez de intensificar a negatividade, ensine-o a fazer as coisas da maneira certa.

Tente entender suas emoções e ensine-as a canalizá-las e a entender esses processos internos.

Originalmente publicado em Siamo Mamme. Via Pensar Contemporâneo.

sábado, 11 de maio de 2019

a barbárie como projeto de nação

Desmonte do pensamento: a barbárie como projeto de nação.

Os desmontes da Educação pública no Brasil começaram na década de 60, no entanto, o sucateamento físico, moral e intelectual verticalizou-se com força a partir dos anos 90, quando avançaram as políticas neoliberais, transformando a Educação em fardo econômico e não mais como um projeto de nação.

Nos últimos 30 anos o país foi submetido a políticas públicas que desvalorizaram a profissão, relegando os professores praticamente a párias sociais. Além de transformarem a profissão, base de toda sociedade civilizada e desenvolvida, em motivo de vergonha social, dentre outros pontos, complementaram o círculo de ruínas, implantando programas de progressão continuada, uma nomenclatura gourmet que, na prática, passou a despejar despejou milhões de cidadãos no mercado sem as menores condições de interpretar a vida.

No sentido inverso, no mesmo período, a Coreia do Sul, então mais subdesenvolvida que o Brasil, iniciava uma profunda transformação por meio de uma revolução educacional, que fez emergir o país como um dos grandes centros tecnológicos do planeta, formando novas gerações de cidadãos, preparadas, que impactaram positivamente em todos os segmentos.

Na contramão da História, no Brasil, os governantes "investiram" no desmonte do pensamento, estereotipando a Educação como gasto e não como investimento.

As atuais políticas de cortes na Educação afundam ainda mais o país para a formação de uma nação cada vez menos pensante. As retaliações orçamentárias na educação básica, no ensino universitário e nos programas de pesquisas, fruto de inimigos ideológicos imaginários, desmontam qualquer projeção para a formação de uma nação desenvolvida. Economia não é constituída apenas por números, mas também por pessoas.

Pior que a retaliação nos investimentos e uma nova investida com matizes ideológicos (sem lastros com a realidade) para justificar possíveis privatizações no futuro é a demonização das atividades intelectuais, estabelecendo um novo grande sofisma de que educar se restringe a aprender uma profissão, direcionando assim, a sociedade para o tecnicismo absoluto.

Segundo estudo conduzido pelo IPM (Instituto Paulo Montenegro) e pela ONG Ação Educativa, em 2016, em que foram entrevistadas 2002 pessoas entre 15 e 64 anos de idade, residentes em zonas urbanas e rurais de todas as regiões do país, apenas 8% das pessoas em idade de trabalhar "capazes de entender e se expressar por meio de letras e números. Ou seja, oito a cada grupo de cem indivíduos da população plenamente capazes de entender e se expressar por meio de letras e números".

Como se constata a partir do estudo, o descaso das últimas décadas com a Educação já criou uma imensa massa ignara. Fato é que, com estes índices destacados na pesquisa, somos preponderantemente uma nação de analfabetos.

O desdobramento desse vácuo de pensamento poderá ser ainda mais danoso. Em um país politicamente polarizado, a massa, com pouca instrumentação cognitiva por culpa dos governantes, sem conhecimentos históricos mínimos e com a pós-verdade sendo estabelecida via redes sociais, esse contingente revela-se incapaz de compreender a sociedade e, como consequência, começa a reescrever a História através distorções e achismos.

Educação não pode ser tratada como objeto de esquerda ou direita.

Quando se renega o pensamento como elemento de desenvolvimento em sentido amplo de uma nação, estabelecido por meio de um sistema sólido de Educação, a única projeção para o futuro é da consolidação do tecnicismo simplista e superficial, formando uma sociedade com hordas destinadas à esteira da produção. Em plena Era da Tecnologia, considerada a quarta revolução, o Brasil adota medidas – e cortes - para a formação de "apertadores de parafusos".

Não há como projetar uma nação desenvolvida sem se considerar um projeto inclusivo de educação.

É necessário um mínimo de bom senso e discernimento para compreender que um povo se desenvolve com pensamento crítico em todas as áreas do conhecimento. Sobretudo, que não se faz uma nação com armas, guerras ideológicas vazias e que transformações reais não se sustentam em redes sociais.

Por mais que pareça óbvio, é preciso compreender que o mundo mudou. Tentar retroagir a mentalidade das pessoas e as novas concepções sociais é como querer pegar uma canoa e tentar fazer com que ela volte a ser árvore.

Brasil 247, brasil247.com.
11 de Maio de 2019

quarta-feira, 20 de março de 2019

Como a internet está matando a democracia

“Fomos muito ingênuos”, adverte o pesquisador e jornalista inglês Jamie Bartlett.

Para ele, nos primórdios da internet “havia uma ampla visão de que o simples fato de tornar a informação mais disponível e permitir que todos pudessem criar e compartilhar informação transformaria o nosso ambiente em mais informado, politizado e racional.”

Não foi o que aconteceu, e segundo ele a radicalização atual nem era tão difícil de prever. Para Bartlett, os grupos radicais chegaram antes à internet por estarem fora dos jornais e do mainstream.

“Mas o mais importante é que todos nós nos tornamos mais radicais”, explica. “Pulamos de um assunto para outro e somos apresentados a mais e mais conteúdos apelativos e sensacionalistas para manter nosso vício nas redes.” Como resultado, somos expostos a argumentos emocionais radicais e acabamos xingando e vociferando nas redes sociais.

Autor do recém-lançado livro The people vs tech: How the internet is killing democracy and how we save it (O povo vs tecnologia: como a internet está matando a democracia – e como podemos salvá-la, em tradução livre), ainda inédito no Brasil, Bartlett faz parte da Demos, um think tank britânico que reúne especialistas em educação e tecnologia para pesquisar temas relacionados à política.

Em entrevista à Pública, Bartlett fala sobre a radicalização promovida pelo ambiente online, desinformação, campanhas digitais e outros perigos da rede para a democracia.

Mas, mais do que constatar os problemas, o pesquisador propõe soluções para avançarmos junto com a tecnologia. Entre elas, um departamento governamental dedicado a fazer uma auditoria de algoritmos e uma base de dados pública, com registros instantâneos, de toda propaganda eleitoral publicada nas redes. Leia a entrevista a seguir:

O surgimento da internet, e depois das redes sociais, veio com a expectativa de uma maior democratização da informação e do debate público. Ao longo do tempo, essa ideia desapareceu. Pesquisadores, incluindo você, mostram que, ao contrário de democratizar, o ambiente virtual potencializou discursos radicais e extremistas. Por que isso aconteceu?

A primeira coisa que precisamos entender é por que fomos tão ingênuos no início. Havia uma ampla visão de que o simples fato de tornar a informação mais disponível e permitir que todos pudessem criar e compartilhar informação transformaria o nosso ambiente em mais informado, politizado e racional. Eu penso que boa parte da razão para essa crença veio do fato de que a maioria das pessoas por trás dessa tecnologia são pessoas da costa oeste dos Estados Unidos, da Califórnia. Pessoas extremamente liberais e grandes defensoras dos poderes naturais da livre informação e alienados das reais questões do mundo. E isso é só uma das explicações. Foi uma ingenuidade criar essas expectativas. As pessoas assumiram que a internet e as redes sociais seriam extremamente livres e que não haveria controle sobre as informações que estariam ali. Ninguém pensou nas consequências.

Mas, olhando com mais atenção, era possível ver que não seria bem assim. Na maioria das novas tecnologias, são as pessoas mais radicais, marginais e até criminosos que primeiro aprendem suas possibilidades. Eles têm essa vantagem, pois, na maioria das vezes, os mais autoritários se consideram excluídos, então dedicam boa parte de sua vida a novas técnicas e tecnologias.

O que eu descobri foi que, se você observar grupos de extrema direita, e até alguns grupos radicais de esquerda, na maioria das democracias, são eles os primeiros usuários de novas tecnologias. Neonazistas, por exemplo, encontraram maneiras de usar as redes sociais para espalhar suas mensagens, porque eles são determinados e não tinham outra forma de fazer isso. Se você os tira da mídia tradicional, é natural que eles procurem outros meios.

Adicione a isso o fato de que em troca da gratuidade das redes sociais nós damos a elas [as empresas de tecnologia] nossos dados. Assim elas tornam essas plataformas ambientes viciantes, para que fiquemos mais tempo lá, fornecendo ainda mais dados. E nossa tendência é clicar naquilo que for mais extremo, radical, inacreditável, pessoal.

Isso deixou as pessoas mais radicais, ou foram os extremistas que se tornaram mais fortes?

Boa pergunta. Eu acho que os radicais cresceram nas plataformas digitais porque tinham essa vantagem de serem usuários há mais tempo. Mas o mais importante é que todos nós nos tornamos mais radicais – não exatamente extremistas, mas somos exponencialmente expostos a conteúdos radicais e apelativos. Não temos a intenção de falar sobre essas temáticas, mas elas nos são apresentadas. Assim, quando entramos nessas plataformas, gritamos uns com os outros, discutimos sobre coisas pequenas, discordamos sem ao menos escutar o outro lado. Pulamos de um assunto para outro e somos apresentados a mais e mais conteúdos apelativos e sensacionalistas para manter nosso vício nas redes. E o resultado é que nos tornamos mais extremos.

E como Trump, nos EUA, e Bolsonaro no Brasil se beneficiaram desse ambiente polarizado?

Na minha opinião, esses políticos se baseiam em frases de efeito e soluções simplistas. E é exatamente isso que funciona nas plataformas de redes sociais. Discursos populistas sempre foram apelativos. Sempre se trata de apelar para o emocional, tratar problemas complexos com soluções fáceis.

As redes sociais são excelentes ambientes para amplificar essas mensagens porque não são tratadas como nos jornais, por exemplo. Com as notícias, temos que nos sentar e pensar sobre o que lemos. Não somos guiados por emoções. Mas nessas plataformas, sim. Quando compartilhamos conteúdos, esperamos respostas, curtidas, então é mais provável que publiquemos conteúdos que nos fazem sentir raiva ou animação do que conteúdos profundos e reflexivos.

Você acredita que essa radicalização impulsionada pelas redes é igual para a direita e para a esquerda?

É uma pergunta muito difícil de responder. Eu acredito que o discurso político que funciona nas redes pode ser tanto de direita quanto de esquerda.

Qual é o papel da desinformação nesse processo de radicalização online?

Levantamento inédito mostra que às vésperas das eleições presidenciais, brasileiros se tornaram segunda maior nacionalidade na plataforma Gab, que é investigada no Brasil e nos EUA

Rastreamos a hashtag que espalhou fake news sobre Jean Wyllys
Iniciados por anônimos, boatos que ligavam ex-deputado a ataque a Bolsonaro explodiram com atuação de Olavo de Carvalho, Alexandre Frota e Lobão no Twitter e Facebook

O problema não é a desinformação em si, mas o fato de haver diversas categorias de notícias falsas nas redes, e todas elas causam um efeito importante.

Na internet você acha todo e qualquer tipo de informação, verdadeira ou falsa. Há aquelas postadas por veículos de notícias e as que são apenas histórias de pessoas e também podem ser confiáveis. E há aquelas que são ruins e mentirosas. Ninguém sabe qual é verdadeira e qual é falsa. Então, no que as pessoas confiam quando não sabem no que acreditar é simplesmente em suas próprias intuições e emoções. Você confia no personagem que você acha que combina mais com você e fala coisas que você acredita. E isso é mais um elemento que beneficia os populistas porque eles geralmente são melhores em convencer as pessoas.

Não é simplesmente a desinformação pela desinformação, é que a informação circula em bolhas. Na rede você encontra dados e estatísticas para embasar qualquer opinião que você tenha. Cada um tem seus próprios fatos. E eles não estão exatamente certos, mas na internet é possível encontrar tanta coisa que existe informação para o que você quiser, tudo que valide sua opinião.

E estar envolvido em tanta informação assim é mais preocupante que as próprias notícias falsas. Por que é isso que faz com que as pessoas não saibam no que acreditar e parem de prestar atenção nos jornais para guiarem-se apenas pelos sentimentos. E é também isso que está tornando os políticos mais radicais, porque ninguém mais tem a autoridade sobre a verdade ou sobre os fatos.

No seu livro, você fala muito sobre o disparo de mensagens na campanha de Donald Trump com a ajuda de dados fornecidos pela empresa Cambridge Analytica. Você pode explicar como essa empresa ajudou Donald Trump, que não era do meio político, a ganhar as eleições nos EUA?

A tecnologia usada não era única ou inovadora, e vem sendo usada por publicitários há muito tempo. Eles basicamente identificaram pessoas que acreditavam que eram mais suscetíveis de serem convencidas pela campanha. O que eles fizeram foi construir perfis detalhados de milhões de americanos usando dados disponibilizados publicamente na internet. Esses dados, que podem ser comprados, incluem coisas como o valor da sua casa, que carro você tem, que revistas assina e muito mais. Eles pegaram o máximo de informações das pessoas que conseguiram e dividiram elas em grupos, enviando conteúdo mais provável de convencê-las.

Além de eleições, essa tecnologia pode influenciar outros aspectos da nossa vida. Somos bombardeados com anúncios personalizados, é como se as empresas soubessem mais de nós que nós mesmos. Como isso afeta a democracia?

Para mim, o maior problema é a popularização dessas técnicas de publicidade com dados, especialmente quando não há regulação. Significa que qualquer um pode dizer que seu opositor está trapaceando.

Qualquer um que perder uma eleição pode dizer que o adversário está usando dados de pessoas indiscriminadamente e manipulando eleitores com publicidade. E isso compromete a integridade de qualquer pleito. Quando você usa essas técnicas, na cabeça das pessoas, isso compromete a integridade de uma eleição.

Você não acha que a popularização dessas técnicas de publicidade vai fazer as pessoas questionarem suas escolhas e atitudes online?

É o seguinte: ninguém acha que foi influenciado por um anúncio. Nunca. As pessoas sempre falam: “Ai, isso não me afeta”. Mas, então, por que os publicitários investem tanto nas redes sociais? Por que eles já testaram e viram que realmente funciona.

Uma das razões pelas quais eu escrevi meu último livro foi para tornar as pessoas mais conscientes da maneira como seus dados estão sendo usados. E eu acho que as pessoas estão cada vez mais preocupadas.

Você vê um crescimento em outras formas de usar a internet?

Sim, eu vejo. Acho que está crescendo e melhorando. No Reino Unido, nós temos VPN [redes privadas individuais], que nos dá mais proteção de dados, e significa que empresas só conseguirão coletar nossos dados se dermos autorização, e isso nos dá o direito de pedir nossos dados de volta também. Já existem empresas que ajudam as pessoas a recuperar seus dados de outras empresas, novas redes sociais estão surgindo. Então, existem pequenas iniciativas nesse sentido. Eu não sei se vai funcionar, ou se vai fazer muita diferença, mas eu vejo melhora.

Existem maneiras de minimizar os efeitos dessa falta de privacidade online sem ser pela via completamente anônima e criptografada. No seu livro, uma das soluções que você sugere é o policiamento dos algoritmos. Você pode explicar como isso funcionaria?

Sim. O que podemos fazer é criar formas de controle democrático sobre os sistemas que possuem nossos dados pessoais. Uma das maneiras de fazer isso é da mesma maneira que fiscalizamos nossas instituições como escolas, serviços de saúde etc., para garantir que eles estejam funcionando. Com os algoritmos isso não é feito. Ninguém sabe se certos tipos de notícias estão sendo privilegiados pelos algoritmos, por exemplo. Eu não tenho a exata solução para isso, mas eu acho que é preciso criar um sistema de fiscalização.

A lógica é: se há um poder, é preciso criar um sistema de fiscalização.

Sim, mas isso precisaria ser feito pelo poder público, e os políticos que temos atualmente mostram muito pouco conhecimento sobre as questões do ambiente digital. Prova disso foi a audiência realizada com Mark Zuckerberg no Congresso americano. Você acha que essa equipe é capaz de formular políticas públicas eficientes nesse sentido?

Eu acho que é possível. Não é preciso ser um engenheiro de computação para pensar em soluções para esses problemas digitais. Eu só acho que é preciso disposição e investimento. Por que não seria possível instalar um departamento para fiscalizar algoritmos? Para mim parece possível e plausível, apesar das dificuldades.

Mas os problemas que temos são urgentes. Como cidadãos, o que podemos fazer?

O que eu mais tenho dito é que precisamos olhar nosso comportamento online como um passo. Eu acredito que temos o dever, como cidadãos, mais importante do que votar, de refletir sobre nosso comportamento online. Que dados estamos criando? Com quem estamos compartilhando? Que plataformas estamos usando?

Porque, toda vez que compartilhamos nossos dados, estamos contribuindo para a sociedade de controle que vivemos atualmente.

E as plataformas? Você acha que elas devem ser mais bem reguladas? De que maneira?

Sim. Eu acho que há regulações que podemos criar. A mais fácil delas seria definir essas empresas como publicitárias e investigá-las para combater oligopólios e promover a livre concorrência. Não pensá-las como plataformas de redes sociais.

Temos que ficar atentos às aquisições que essas empresas fazem, porque muitas vezes elas compram plataformas menores antes mesmo que estas se tornem competitivas. Então, temos que bloquear esse tipo de compra.

E há algumas outras coisas, como regular o conteúdo que circula nesses lugares, como o discurso de ódio. E multá-las caso não removam esses conteúdos.

Que outras medidas legais precisam ser tomadas na sua opinião?

Devemos atualizar as legislações eleitorais urgentemente, porque elas estão ultrapassadas. Uma das coisas que eu proponho é que todos os anúncios usados em campanhas eleitorais devem ser publicados em tempo real num banco de dados público para todos verem. Eu acho uma medida importante e fácil de ser implementada. Acho que isso pode aumentar a confiabilidade das eleições.

E também precisamos melhorar de uma maneira geral o sistema educacional, porque nenhum dá a verdadeira atenção para o estudo dos problemas de desinformação, deep fakes, fake news. E as pessoas convivem com isso todos os dias. Portanto, precisamos de uma drástica melhora na maneira como ensinamos media literacy [alfabetização midiática]. Estamos muito atrasados.

Do site
https://apublica.org/2019/03/como-a-internet-esta-matando-a-democracia/

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Droga, uma economia informal. Antônio Risério

Tem um outro dado aí que é o tráfico de drogas, consumo e tráfico de drogas, que gera muito dinheiro... 
E emprego.

Pois é, a economia informal da cidade gera mais que a formal... E gera muita violência em cima disso, muita repressão policial, muita corrupção. Corrupção policial, corrupção política, corrupção da Justiça. Como esse elemento, que não existia e que agora é cada vez mais forte em Salvador, pode mexer e já está mexendo no quadro em que a gente vive? 
Não acho que o negócio das drogas tenha criado um "Estado paralelo", como falam. Pode até ter formas fragmentárias de atuação de tipo estatal, coisas filantrópicas, até tribunais e tal. Mas nem chega a ser uma organização para-estatal. É apenas um empresariado ilegal e o que você tem são grupos armados disputando espaços de mercado. Nem tem também essa história de guerra civil. Guerra civil é quando uma classe ou uma etnia, por exemplo, enfrenta outra, por questões econômicas, ideológicas, etc. Você tem mesmo é disputa de mercado, numa situação de ilegalidade. O tráfico oferece ao jovem pobre, além de aventura e risco, coisas que a juventude adora, dinheiro e acesso ao consumo. Você fica vendo o tempo todo, nas novelas da Globo, aquele padrão de vida ali... e vai ter acesso àquilo como? Ou tomando ou traficando, não há muitos caminhos. Não temos política educacional, a política de inclusão social ainda é muito fraca, não tem inclusão cultural, não tem nada. A periferia é abandonada e é um prato cheio, claro, para o tráfico. Com um agravante, hoje, que é o seguinte. Antes, a gente falava que o que distinguia o tráfico no Brasil era a base territorial. É um traço específico da bandidagem brasileira. Uma quadrilha controlava um morro no Rio, por exemplo, que então era fechado a outras quadrilhas. Aqui, também. Era a partir da base territorial que se negociava. Era isso que fazia, por exemplo, com que o crack não entrasse no Rio. Mas esse ano a gente viu que esse negócio foi detonado. O PCC passou a controlar financeiramente o tráfico carioca. Então, essas bases territoriais não existem mais. Continuam sob controle, mas não são fechadas ao jogo financeiro. O que existe hoje são redes de empresas do tráfico, sediadas em São Paulo, como as grandes empresas legais. Esse empresariado paralelo está no país todo e de forma organizada. Agora, para lidar com isso a gente também não pode ser hipócrita. É o óbvio: se existe tráfico, existem consumidores. Um sujeito que cheira pó, num apartamento de luxo na Vitória, não tem autoridade nenhuma para falar de tráfico e violência urbana. Ele tem que se ver como cúmplice, como partícipe do processo. Sem ele, o tráfico de drogas não existiria. Muita gente não tem consciência disso, fala como se o tráfico fosse uma coisa distante. Não é. Nós fazemos parte desse circuito comercial. Nós fazemos parte estruturalmente do tráfico de drogas. Nós somos o mercado.

O fato de ser uma briga territorial faz com que determinadas áreas das cidades, inclusive aqui em Salvador, sejam totalmente dominadas. Não entra polícia, nem serviços públicos, nem nada. Como se fosse um território estrangeiro. 
E que foi criado graças à complacência dos poderes públicos, que nunca quiseram lidar com isso, sempre pactuaram, permitiram, e isso alimentado pelo conjunto da sociedade. Agora, é o seguinte. Essas bases territoriais distinguem o tráfico brasileiro do tráfico de Londres ou Nova York, por exemplo, onde você tem tráfico, mas não tem base territorial. E isso é uma coisa terrível aqui. Porque, com a base territorial, você tem comunidades controladas e pessoas que já nascem naquilo, né? Todo mundo sabe disso no Rio, mas não vejo ninguém discutindo isso em Salvador. Você vê como as coisas estão reduzidas aqui. Em relação a tudo. Passei esse ano em São Paulo e não tinha uma semana que eu não recebesse um manifesto para assinar. Aí você pensa, é a sociedade civil se movimentando e tal. Mas tudo era manifesto para preservar alguma coisa. Claro que há coisas há serem preservadas. Mas nem sempre era o caso. Não tem mais critério. Eu digo: até fogareiro de baiana do acarajé virou monumento histórico. Só tinha preocupação preservacionista e nenhum projeto para o presente ou para o futuro? Por outro lado, até entendo. As intervenções no espaço urbano de Salvador têm sido tão desastrosas que você se sente inclinado a preservar até tampinha de guaraná. Mas a cidade não pode ficar paralisada. Isso aqui precisa de uma puta sacudida. De onde, não sei.

Talvez do tráfico... 
Vamos ver se essa meninada aí vem com alguma coisa. O que resta à gente é tentar transformar o que é possível transformar. Mas é difícil. Você apresenta um projeto, acham maravilhoso, mas não vai pra lugar nenhum. Nós estamos vivendo no reino da lábia.

O que é o reino da lábia? 
Todo mundo fala, acha ótimo, faz um barulho, mas fica só nisso. Parece psicanalista, que acha que resolve tudo na conversa. Aqui, as pessoas conversam sobre um assunto e acham que o assunto foi resolvido. A conversa não é uma preliminar pra encarar o problema. O problema já se resolve na conversa. Quer dizer, a conversa é um âmbito auto-suficiente onde as coisas se resolvem. Deveria se fazer aqui o que o governador de Brasília fez. Proibiu o gerúndio: estamos fazendo, estamos construindo, estamos dando... Sempre estamos dando alguma coisa, mas cadê a coisa?

Antônio Risério, poeta e antropólogo
entrevista a Mário Kertész (Revista Metrópole, n. 17, novembro 2008)
Reprodução de "Terra Magazine"