A característica
fundamental da Contracultura é ser a expressão de uma visão juvenil,
foram nos jovens que inventaram a contracultura (e fenômenos afins, como
o tropicalismo) e, portanto a rejeição a ela pela maturidade é
inevitável.
A
história da cultura do ocidente é marcada pela visão juvenil, seus
momentos mais inovadores e radicais foram responsabilidade dos mais
jovens. Nossa cultura é marcada pelo arquétipo do jovem rebelde, um
culto tão poderoso quarto a sua antítese, o respeito oriental pelos mais
velhos.
Por outro lado, a visão característica básica da visão madura é a necessidade de organização.
Um
mundo organizado pela visão madura, manifesta em toda espécie de leis e
regulamentos, deve sofrer periodicamente as fraturas criadas pela visão
juvenil. Trata – se da condição de equilíbrio mínimo, capaz de insuflar
a renovação num mundo dominado pela rigidez da ordem.
Ainda
que perigosa, a anarquia juvenil, ao contrário, é vitalizadora.
Movimentos culturais tipicamente dominados por jovens, como os surgidos
na era áurea do “Poder Jovem”, os anos sessenta, como a Contracultura e o
Tropicalismo, são exemplos típicos da visão juvenil.
O
tempo que opera a visão juvenil é a eternidade, o que gera uma
confiança cega no futuro. O jovem é jovem para sempre – e isso
escandaliza a visão madura, assediada pela consciência da morte.
A
principal função social da visão juvenil é a de gerar antídotos contra
os venenos propiciados pela visão madura e seus apegos característicos.
Pode – se dizer, portanto, que a vida que a vida é renovada através da
insensatez.
O
centro vital da Contracultura era a experiência da expansão da
consciência. A mente se expande, a realidade se amplia. Não se trata
mais de uma cisão esquizofrênica que abandona o corpo para tratar da
alma, mas simplesmente perceber que corpo e alma são muito mais do que
pensam tanto materialistas quanto espiritualistas.
Tal
avanço foi de espantar todo mundo; os mais conservadores, em especial,
inclusive da esquerda, ficaram assustados. Colocar o real como um todo,
de maneira tão radical, era de uma audácia intolerável.
A reação procurou responder a ousadia à altura, procurando deter o avanço da consciência em todos os níveis.
Em
primeiro lugar, a expansão da consciência tinha que ser sustada, antes
que a adesão e o consenso acumulassem poder suficiente para fazer
desmoronar, a nível coletivo, o pretenso mundo objetivo, ou seja, a
nossa realidade habitual.
A liberdade de consciência é a verdadeira fonte de todo poder realmente revolucionário.
Sim,
as ousadias da época tiveram que ser anuladas, ou eliminadas, ou, pelo
menos, distorcidas para que o mundo continuasse a ser o que era e “os
mesmos patifes de sempre continuassem a mandar em tudo”, conforme disse
John Lennon, ao declarar o fim do sonho. Para isso, os meios de
anulação, eliminação e distorção foram aperfeiçoados e refinados. A
redução do milagre da consciência a um fenômeno material, físico,
químico, ou biológico, na cega tentativa de negar o mistério,
exemplifica bem, a nível acadêmico, essa tentativa, tão ampla quanto
refinada, de manter o “status quo” espiritual de nossa cultura.
Hoje,
as manifestações juvenis de nosso passado recente, depois de domadas,
assimiladas e distorcidas pelo sistema, foram substituídas por um
fetiche abstrato e bastante ridículo que é o jovem tal como é definido
pelas agências de publicidade, delineado pelas pesquisas de opinião,
incensado pela mídia, tomado por paradigma de eficiência empresarial (o
tal do Yuppie) e, o que é pior de tudo, imposto como modelo aos ainda
mais jovens, ou seja, nossas crianças. Esse “jovem” é o que, no meu
tempo, chamávamos de alienado e, depois, de careta. Trata – se de uma domesticação dos instintos naturais da juventude em função dos interesses do sistema.
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