domingo, 31 de dezembro de 2023

Violência natural e violência não natural

Resumo de um espetacular podcast com o tema da violência.

Muito se fala sobre a violência de um modo geral no nosso dia-a-dia, está nos noticiários, isso é uma tônica do momento.  Você poderia nos dizer o que é a violência e nos explicar como evitá-la?

- Quando você vai analisar de uma forma um pouco mais profunda o termo violência tem três conotações: 

1- A violência natural que são as transformações como vulcões, força das marés... são forças violentas. 
2 - A violência natural entre os animais, os combates até a morte. Quando você vê o leão perseguindo a sua presa não existe uma maldade. 
3 - A violência não tão natural como as duas acima que é esse arrebatamento humano quando somos dominados por sentimentos de raiva, arrebatados por um força que nos torna violentos.

E como a educação poderia reverter esse quadro do item 3?

- Quando a gente coloca essa questão do que a educação poderia propor nós falaremos de uma formação filosófica que permitisse dominar os nossos aspectos animalescos e fazer primar os nossos aspectos humanos, nossos aspectos civilizados.
- A educação atual se tornou de modo geral muito informativa, ou seja, você despeja uma quantidade de informações enorme nas crianças e informações que muitas vezes não vão se conectar com o dia a dia delas e não vão ajudá-las a se tornar seres humanos melhores.
- Eu acho curioso porque muito se fala na educação técnica no campo profissional, e, às vezes, o sujeito nem tem tanta expertise técnica mas através de fatores humanos ele se torna muito mais útil para para o seu contexto, muito mais produtivo.
- o sucesso ou fracasso do homem como ser humano e suas realizações parece estar muito mais ligado a fatores como saber conviver com os demais, saber controlar os seus próprios impulsos, saber lidar com as suas inseguranças.

- Os gregos diziam que o ser humano tem três partes básicas:

1- No aspecto somático seria o corpo físico e a sua vitalidade.
2 - No aspecto mais sutil que eles chamavam de psiquê. A psiquê é o conjunto de elementos emocionais e mentais.
3 - Há um outro aspecto ainda mais sutil do que a mente e que eles chamavam de Nous.
Seria o aspecto metafísico do ser humano. Algo que você não pode pesar, nem ver, mas que tem uma influência muito grande. É esse aspecto que vai falar muito dessa questão do mistério do ser humano. Vimos seres humanos vivendo em condições sobre-humanas mas que conseguem se tornar pessoas de bem e, às vezes, o contrário, pessoas que tem tudo do melhor e se tornam degenerados, maus caracteres. 

A educação tem que prever todos esses aspectos, somático, psiquê, Nous.

No entanto, e grandemente, o aspecto psicológico na formação da criança é relegado. Você se preocupa desde cedo se a criança está andando direito, se a criança começa a falar no tempo certo, se ela tá crescendo no tempo certo, mas, e os aspectos emocionais????

O ser humano precisa de uma educação que forme também a sua alma. Existem lugares no mundo que tem essas questões muito bem resolvidas, mas que não garante que as pessoas sejam felizes. Ou seja, as pessoas têm uma condição econômica estável, tem uma condição social estável, e, no entanto, às vezes, falta algo. 

Aqui se chega às aspirações filosóficas. E quando você tira essas aspirações filosóficas do ser humano ele se torna incompleto. Quando você retira esse elemento mais filosófico do ser humano ele se animaliza. 

E quando ele se animaliza, ele se torna competitivo, ele se torna destrutivo, e daí ele se torna o que mais suscetível a violência porque não tem controle dos seus próprios instintos, então, ele fica um pouco mais animal, fica mais sujeito a essa violência.

E a violência nos toca todos. Há um pensamento do Pitágoras que diz que "eduquem as crianças e não será necessário punir aos homens ".

Existe um tratado hindu muito famoso que é o Bhagavad-Gita.
Na verdade é uma grande analogia de uma guerra interior. Essa guerra é que devemos travar no nosso dia a dia porque não basta simplesmente reconhecer o aspecto mais sutil ou mais animal dentro de nós. É necessário que você comece a se trabalhar para fazer prevalecer o aspecto mais humano, o aspecto mais filosófico.

Esses ensinamentos filosóficos podem nos ensinar a entender e dominar a violência. 

Conhecer os textos filosóficos antigos pode nos ensinar a não sermos arrogantes. O Bhagavad Gita é um livro sagrado que fala sobre um príncipe que precisa enfrentar um grande exército. Tal exército representaria os aspectos instintivos do ser humano. Só que para que ele realizar esse combate ele não pode sozinho. Ele tem que primeiro treinar o seu exército de virtudes.
Isso é uma chave fantástica porque a natureza  não gosta do vazio. Ela sempre vai preencher os espaços vazios com alguma coisa.
Então, às vezes, a gente se concentra muito no problema, nos vícios... como é que eu vou me livrar dele?... Quando na verdade você deveria se concentrar mas na virtude. Porque quando você preenche algo com luz a sombra não vai ter espaço.

Isso é muito interessante no nosso dia-a-dia, se nós ocuparmos o nosso tempo com coisas úteis e mais elevadas não vai sobrar tempo para a gente cultivar a o aspecto animalesco não né?... Então isso é algo muito prático que tá no nosso dia a dia.

Concluindo, eu diria que o que a educação tem para nos apontar é uma filosofia no sentido de trabalhar a violência.
 
Primeiro, seria essa educação formativa porque ela vai nos permitir, nos tornar realmente humanos. Vai nos tornar mais civilizados, vai permitir que a gente possa identificar os nossos impulsos instintivos e dominá-los.

Um outro aspecto é que existe um ciclo predador/vítima. Só existe o predador onde tem a vítima. Vemos muito isso nos casos de bullying. Nas escolas sempre tem um cara que acaba sendo o alvo... o alvo da turma e muitas vezes é por uma falta de posicionamento. Por falta de alguma ferramenta ou de uma forma de você não saber dizer não, porque se você é uma pessoa que nunca se posiciona todo mundo vai chegar e vai detonar você. Vai poder fazer o que quiser com você. Isso é reflexo dessa guerra interior de que fala o livro Bhagavad Gita. A medida que você vence essa guerra interna você vai se tornar mais forte externamente.
Se você tem três ou quatro pessoas e tem um cachorro do outro lado da quadra, o cachorro vai morder aquela pessoa que tá com mais medo, né?  Que é quase sempre quem tem mais uma inclinação para o papel de vítima. E é porque o animal também tem esse instinto ele sente isso e o malandro também é instintivo. Ele não vai atacar um cara que está  ligado, alguém que está bem posicionado. Ele vai preferir atacar a pessoa que está distraída.

A educação deve nos preparar também para sermos atentos aos movimentos da vida, atentos aos nossos próprios movimentos internos. Isso é um reflexo bem prático do cultivo de uma vida mais filosófica e o quão importante é essa educação. Ser filósofo é saber um pouco quem eu sou, né?

Isso é muito curioso. Quando você não sabe o que você é, quem você é,  naquela velha máxima "conhece-te a ti mesmo",  quando você não sabe...  você é qualquer um... 
E são as portas pessoas que chegarão para falar o que você é, o que você gosta, o que você quer comprar ... 
Mas quando você está bem posicionado, terá uma memória afetiva de si mesmo muito bem formada fica difícil alguém predador chegar para você e dizer como você tem que conduzir a sua vida.

Podcast completo em:
https://open.spotify.com/episode/1IG5uxwSzaWTEhXUXeqeTk?si=1cwN7dLRRiCs_nUf7JyEPw

Nenhum comentário:

Postar um comentário