quarta-feira, 13 de julho de 2016

O mundo em crise de modelo e o debate restrito à economia.

Por Assis Ribeiro

O mundo em crise de modelo e o debate restrito à economia.

O desprezo pela história, pela filosofia, e por toda a área que esteja fora do pragmático modelo, levou o mundo a não entender o que está ocorrendo, portanto, incapaz de oferecer soluções.

Após os avanços democráticos conseguidos pelos movimentos da década de sessenta, o sistema se armou para deter novas conquistas e reduzir as que foram alcançadas.

Para isso domesticou os instintos transformadores criando padrões exclusivistas, definitivos do bom, justo, perfeito e acabado, condicionando as populações a serem defensoras dos interesses do sistema, e não questionadoras do que nos é posto.

O mundo se encontra em outra fase de passos retroativos, então, igual à catapulta que é puxada para trás para ser impulsionada para a frente, o salto virá, o novo aparecerá.

Independem do sistema dominante os avanços obtidos pelas sociedades. O que difere é a forma como eles são alcançados.
  1. O modelo cede para que direitos sejam incorporados de forma menos traumática, vide os exemplos dos avanços trazidos pela Revolução Industrial e os frutos obtidos pelos movimentos da década de sessenta.
  2. O modelo não cede e as mudanças são arrancadas à força, como na Revolução Francesa, americana, e em outras guerras intestinas ou mundiais.
O saudoso pensador Milton Santos já nos alertava sobre a chegada de um tempo novo:

“... A gestação do novo, na história, dá-se frequentemente, de modo quase imperceptível para os contemporâneos, já que suas sementes começam a se impor quando ainda o velho é quantitativamente dominante. É exatamente por isso que a “qualidade” do novo pode passar despercebida... A história se caracteriza como uma sucessão ininterrupta de épocas. Essa idéia de movimento e mudança é inerente à evolução da humanidade. É dessa forma que os períodos nascem, amadurecem e morrem...”

Líderes e grandes riscos da falta deles

Nos conflitos do passado estiveram presentes grandes líderes que puderem compreender a insatisfação das populações e apresentar caminhos alternativos para solucionar os atritos. Pela liderança, têm a força aglutinadora que mantêm as populações organizadas, diminuindo os riscos de formação de turbas.

Esses caminhos alternativos são exatamente o novo, que Nassif preconiza, e que teima em não vir.

Não nasce o novo se o velho é tido como justo e perfeito. Ou como os mais condicionados afirmam: "é o fim história", "não há alternativas ao modelo", " a solução está no crescimento das economias".

Nos tempos atuais estamos completamente órfãos.

E não se trata apenas da falta de líderes políticos. Há escassez na academia, na música, na literatura, nos sindicatos, em todos os segmentos da sociedade.

A falta deles cria o risco da formação de multidão em movimento desordenado e com potencial violento.

Formou-se uma hegemonia que foi muito além de ditar os pensamentos a serem seguidos.

Na falta de lideranças, preconiza Milton Santos:

“Estamos convencidos de que a mudança histórica em  perspectiva provirá de um movimento de baixo para cima, tendo como atores principais os  países subdesenvolvidos e não os países ricos; os deserdados e  os pobres e não os opulentos e outras classes obesas; que o indivíduo liberado partícipe das novas massas e não o homem acorrentado; o pensamento livre e não o discurso único."

A destruição do pensamento

Todos os que pensam fora do parâmetro são ridicularizados, rotulados de Poliana, sonhadores, irrealistas, e mesmo a volta de adjetivos criminalizantes como subversivos, baderneiros, extremistas e comunistas.

A mídia atua como força auxiliar banindo dos seus quadros comentaristas que não tenham opiniões “aceitáveis” e repetindo exaustivamente o ideal hegemônico, condicionando o pensamento e fabricando robôs repetidores. Acaba-se a reflexão e surge uma legião de seguidores.

Como Wolin escreveu, “bloqueia, elimina o que quer que proponha qualificação, ambiguidade ou diálogo, qualquer coisa que enfraqueça ou complique a  sua criação, a sua completa capacidade de influenciar”.

Por isso a falta de líderes, os que se apresentam em determinados períodos da história para apontarem os descontentamentos e apresentarem as soluções, que sempre vão no sentido de caminhos alternativos.

Esses caminhos alternativos são o novo que Nassif busca, e teima em não vir.

Ai está a grande vitória do modelo, a destruição do pensamento.

Não nasce o novo se o velho é tido como justo e perfeito, por isso muitos repetem as afirmações: “é o fim história”, “não há alternativas ao modelo”, “ a solução está no crescimento das economias".

Ai está a grande vitória do modelo que se esgarça e teima em não ceder; a destruição do pensamento.

A crise continua que se alastra

O mais grave não é propriamente a crise econômica e politica.

Se fosse assim os Estados não precisariam se armar até os dentes, o sistema não criaria leis draconianas, as policias não estariam agindo com estrema violência; o mundo não estaria repleto de instrumentos de repressão.

Se fosse econômica governos de esquerda igualmente aos governos de direita não estariam fracassados.

Se fosse politica a substituição dos governantes por grupos contrários resolveria o problema. Os países têm trocado seus governantes em eleições democráticas e as crises continuam.

A crise é existencial, por mudanças de valores, como os acontecimentos da década de sessenta que mesmo os países em franco crescimento econômico, ainda assim pipocaram os descontentamentos e explodiram as discórdias.

Da meritocracia à fisiocracia.  Ressurge o Brucutu alienado

O sistema perde o controle. O submodelo da meritocracia que manteve nos sonhos de alcançar o sucesso pelos estudos um certo ordenamento, perdeu força.  Se o conforto e equilíbrio prometido pelo modelo não foi entregue, outros referenciais são buscados.

Os nossos jovens parecem mais preocupados em adquirir músculos do que o conhecimento. Os movimentos culturais comprovam a afirmação. Na música, letras e ritmos que remetem ao poder cru e violento expressado principalmente nas batalhas entre sexos opostos. Surge a ânsia da “pegada”.  Nas TVs programas que defendem a violência do estado contra a violência da sociedade. Os joguinhos, violência de alta complexidade. Câmeras de vigilância por todos os cantos nos lembrando sempre a iminência da violência.

Trata-se de um hedonismo exagerado próprio da insatisfação que gera frustração, do medo que gera prepotência, da insegurança que gera a agressividade. Está ai formado os jovens das academias, os “pegadores”.

São os coxinhas, grossos em cima, de pernas finas, e sem nada na cabeça.  Seus ídolos já não são os referenciais da literatura, das artes e do conhecimento como tiveram os jovens de outrora. Preferem idolatrar os lutadores de UFC e ter como heróis tipos como Bolsonaro. São avessos à leitura e querem tudo imediato,  pronto e acabado.

Não é à toa que a intolerância e a violência têm aumentado assustadoramente. Não é sem explicação que na política pessoas do perfil de Bolsonaro e Donald Trump estejam em alta.

A falência de um modelo

Um modelo se esgota quando não consegue mais fornecer explicações, caminhos e normas gerais que orientem a sociedade.

As regras adotadas não conseguem mais resolver os problemas. A cada novo conflito vão surgindo outros de maior complexidade, até o limite da explosão.

Não sendo mais capazes de apresentar soluções, os paradigmas vigentes começam a revelar-se como a própria fonte dos problemas.

O modelo atual agoniza

O modelo que fragmentou o todo para que pudéssemos entendê-lo não foi suficiente. E nem poderia sê-lo, pois “o todo é maior do que a simples soma de suas partes”, como dizia, desde tempos remotos, Aristóteles.

Esse é o principio adotado pelo Holismo que pretende apresentar o que seria o novo.

Sua base é a confrontação ao modelo atual. Opõe-se ao método cartesiano, na medida em que este afirma que a análise das partes é suficiente para compreender o todo. Sendo, portanto, um método não-reducionista. O Holismo defende que o todo possui características que não podem ser adequadamente compreendidas pela simples análise das partes, mas apenas por uma análise sistêmica de toda a estrutura, já que as partes formam um organismo com características e configurações próprias.

Estes princípios se opõem assim como individualidade/coletividade, exclusão/inclusão, egoísmo/solidariedade, concentração/divisão, dispersão/união, separação/aglutinação, materialidade/espiritualidade; ou seja, os princípios básicos e elementais da formação de qualquer paradigma e seus submodelos econômico, social e politico.

O novo modelo

Os submodelos exauridos de individualidade, exclusão, egoísmo, dispersão,  separação, materialidade,  explicam a corrida para o novo, muitas vezes apresentado, pelo reducionismo de que o problema está na economia, na forma  de “Sustentabilidade” e  “economia verde”, ou na redistribuição de riqueza,  substratos dos princípios Holísticos da solidariedade, coletividade, inclusão, aglutinação, espiritualidade.

O novo virá através de um movimento de caráter ético e humanista que questiona a atual sociedade de consumo e desperdício, formadora das desigualdades sociais e que impulsiona o domínio de países sobre outros povos e a exploração de homens sobre outros seres, propondo um novo paradigma (modelo) de vida.

O atual modelo alimenta-se do seu próprio crescimento incessante, causando prejuízos e insatisfações, trazendo vários problemas com o seu modelo de competitividade, favorecendo o individualismo e egoísmo, gerando a exclusão social e o desemprego.

Os padrões atuais de produção e consumo estão causando devastação ambiental, esgotamento dos recursos e injustiças sociais. 

A noção de desenvolvimento sustentável busca o crescimento com cuidado ambiental que proteja a capacidade regenerativa da Terra, e que traga o equilíbrio econômico entre pessoas e povos dos direitos humanos e do bem-estar comunitário, para que finalmente floresça a segurança interna e externa para os povos.

O novo obrigatoriamente valorizará as sinergias comunitárias e globais de cooperação e ajuda mútua, criando novas oportunidades para construir um mundo mais democrático e humano.

Mais uma vez, nos chamava a atenção a genialidade de Milton Santos:

“A primazia do homem supõe que ele estará colocado no centro das preocupações do mundo... Dessa forma, estarão assegurados o império da compaixão nas relações interpessoais e o estímulo a solidariedade social, a ser exercida pelos indivíduos, entre o indivíduo e a sociedade e vice-versa e entre a sociedade e o Estado, reduzindo as fraturas sociais, impondo uma nova ética, e, destarte, assentando bases sólidas para uma nova sociedade, uma nova economia, um novo espaço geográfico.”

A natureza e as populações estão saturadas. O novo urge.

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