Se os partidos políticos serviram como instrumento principal
para pessoas e grupos entrarem no sistema político para expor suas
reivindicações, necessidades e sonhos, formadores
das decisões políticas, nos dias atuais é visível o esvaziamento da importância
da base formadora de opiniões e decisões, ficando a nítida sensação de que os
partidos não mais representam essa função pela dependência aos patrocinadores nas caríssimas eleições e medo dos trituradores platinados.
Deste modo, quanto maior o nível de participação dos
cidadãos mais controle sobre as delegações, favorecendo a solidez das estruturas
políticas. Em outras palavras, a possibilidade dos partidos serem instrumento
de democracia está dependente do controle direto e da participação das massas.
Não se podem negar essas verdades quando observadas as
manifestações desde a de junho de 2013, até as que foram a favor e contra o
golpe contra o governo Dilma. Ficou estampado o afastamento das populações dos políticos
e partidos, da expulsão de Alckmin e de Aécio Neve,
das vaias a Marta Suplicy, nas manifestações pró - impeachment, até o
desaparecimento dos políticos e dirigentes partidários de todos os movimentos
de ruas.
Sequer tais movimentos permitem a participação de
carreiristas na organização e articulação das manifestações. Gerou-se a confusão de nomenclatura quando se lhes foi denominado de
“apolíticos” no lugar de apartidários. Tudo tem ocorrido
não a partir dos partidos políticos e sim das redes de comunicação.
Esse afastamento dos partidos políticos da população foi antevisto
por Orwell e Huxley, nos seus distópicos livros, “1984” publicado em 1949 e “Admirável
Mundo Novo” de 1932, respectivamente, onde apontaram nossa decadência em
direção ao totalitarismo corporativo.
Zygmunt Bauman, um dos maiores estudiosos dos fenômenos da
atualidade, explica o desordenamento da politica e suas preocupações com as
redes. Segue as considerações do pensador, entrevistado por Alessandro Gilioli,
no L’espresso | Tradução: Antonio Martins:
...citando Gramsci:
“se o velho morre e o novo não nasce, neste interregno ocorrem os fenômenos
mórbidos mais diversos”.
Redes sociais criaram
redomas de pensamento único. Democracia é devastada por poderes globais. Há saídas,
mas vivemos a “hora mórbida”.
Portanto, segundo o
senhor, não há uma relação entre a difusão da internet e os protestos
anti-sistema?
Sim, há, mas a
internet não é a causa, é só um veículo. As causas dos partidos anti-sistema
relacionam-se, na verdade, com a crise de confiança na democracia.
Artigo completo em:
Em reflexões para o blog de Nassif, com base em leituras
da obra de Bauman, concluo sobre os movimentos de rua:
A sensação de não pertencimento é clara neste mundo que
magistralmente Bauman definiu de "liquido", a sensação de vazio pode
ser observada sobretudo nos jovens, e talvez seja o efeito colateral do
individualismo defendido pelo modelo que escolhemos e que parece que está nos
levando à solidão, ao não pertencimento, ao vazio, situações que favorecem ao
chamamento para atos contrários ao Status quo mesmo alguns dos jovens fazendo
parte dele.
É deste sentimento inicialmente difuso de frustração e
descontentamento que surgem os vários movimentos rebeldes.
A sensação de exclusão é enorme, e claro, atinge
principalmente aos mais jovens.
Alguns artigos relativos à Bauman em meu blog:
Mas, é o grande pensador brasileiro, o geógrafo Milton
Santos que aponta não só as causas dos nossos problemas mas de onde surgirão os caminhos
para o novo, na política, nas formas da representação popular e no destino do
nosso País, diz o mestre:
A imprensa como
instrumento de propaganda a serviço de grupos específicos
A globalização
perversa é baseada em fábulas como a da comunicação global, do espaço e tempo
contraídos, da desterritorialização e da morte do Estado. São fábulas porque a
informação é centralizada e manipulada no interesse das grandes empresas. A
diminuição de espaço e tempo pregada só acontece para poucos. A globalização
perversa precisa dos territórios e dos governos internos para se manter a morte
do Estado, por sua vez, só aproveita às poucas empresas hegemônicas.
Todas essas fábulas
são inculcadas nos cidadãos antes mesmo de qualquer ação.
Nascem daí a violência
estrutural e a perversidade sistêmica, onde a competitividade e a potência
(falta de solidariedade ou prevalência sobre os outros) puras, unidas à
ideologia neoliberal, fazem parecer normais as exclusões sociais. Fala-se muito
em violência da sociedade de nosso tempo, mas esquece-se que as violências que
mais percebemos são apenas derivadas. A violência estrutural resulta da
presença, em estado puro, da competitividade, da potência e do dinheiro. A
essência da perversidade é a competitividade, uma guerra em que tudo vale para
conquistar melhores espaços no mercado.
A gestão do “novo”
A gestação do novo, na
história, dá-se frequentemente, de modo quase imperceptível para os
contemporâneos, já que suas sementes começam a se impor quando ainda o velho é
quantitativamente dominante. É exatamente por isso que a “qualidade” do novo
pode passar despercebida... A história se caracteriza como uma sucessão
ininterrupta de épocas. Essa ideia de movimento e mudança é inerente à evolução
da humanidade. É dessa forma que os períodos nascem, amadurecem e morrem.
Uma outra globalização supõe uma mudança
radical das condições atuais, de modo que a centralidade de todas as ações seja
localizada no homem: a precedência do homem. Sem dúvida, essa desejada mudança
apenas ocorrerá no fim do processo, durante o qual o reajustamentos sucessivos
se imporão. Nas presentes circunstâncias a centralidade é ocupada pelo
dinheiro, em suas formas mais agressivas, um dinheiro em estado puro sustentado
por uma informação ideológica, com a qual encontram simbiose.
Os atores que vão
mudar a história são os atores de baixo. Vão agir de baixo para cima. Os pobres
em cada país, os países pobres dentro dos diversos continente, os continentes
pobres em face dos continentes ricos. De tal forma, não teremos uma revolução
sincronizada: haverá explosões aqui e ali em momentos diferentes, mas que serão
impossíveis de conter.
Matéria completa no link:
Outros resumos do pensamento de Milton Santos:
http://assisprocura.blogspot.com.br/2014/08/a-atualidade-do-pensamento-de-milton.html#uds-search-results
Conclusão
Assustador a situação da representatividade, mas a descrença da população tem mais a ver com as siglas
partidárias do que com o sistema político como um todo. Se os partidos olham
mais para o seu projeto de poder do que para um projeto de sociedade, essa é
falha mais dos partidos do que do sistema partidário.
Qualquer democracia representativa exige a ação coletiva,
que acontece através dos partidos, e na omissão destes, por qualquer outra forma que
venha a se apresentar.
O novo não sairá dos manifestantes da classe média que foram
às ruas, condicionados pela TV Globo, para fazer a catarse com os gritos
insanos de apolíticos, com a raiva criada e direcionada para o único grupamento
que preenchia os requisitos para ser chamado de partido político.
O novo sairá de novas composições inclusivas que unam “os atores
de baixo”, como diz Milton Santos, com os da classe média já conscientes de que
um Brasil novo e melhor se impõe independentemente da vontade daqueles que detêm
o Status Quo e têm a mente orientada ao ódio e ao segregacionismo.
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