quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Ser livre

CULT: Há um encolhimento da capacidade humana de refletir e fazer escolhas ponderadas? Tanto do lado da polícia como do de certos grupos de esquerda…

Marilena Chaui: Eu entendo isso com Espinosa. O que há nos seres humanos? Há paixões. A maneira como entendemos o mundo, a nós mesmos e aos outros é dada pela maneira como o mundo e os outros nos afetam. Eles causam em nós a sensação de perigo ou de aumento da nossa capacidade de viver. Se tudo o que se passa em mim é produzido pela maneira como o que está fora age sobre mim, eu sou passiva e todos os meus sentimentos são apenas paixões: o amor, a esperança, o ciúme, a misericórdia, a honra, a glória etc. O que eu sinto é pura e simplesmente uma reação passiva ao que vem de fora.

Ao contrário, se eu tenho força interior para saber que eu posso ser a causa dos meus sentimentos e, que se sinto raiva de você, não é por sua causa, mas por aquilo que eu sinto com relação ao que eu penso a seu respeito, então me vejo como a causa da raiva que sinto por você, em função do modo como eu penso em você ou percebo você. A partir do momento em que eu sou capaz de me reconhecer como causa dos meus sentimentos, eu sou ativa e descubro que não tenho de responsabilizar os outros por aquilo que se passa em mim. Se eu for passiva, nunca serei livre; tudo o que eu fizer será determinado pelo que os outros exigem de mim; e, mesmo que eles não façam nenhuma exigência, eu sinto como uma exigência. Então só obedeço ao que eu imagino que seja o desejo do outro. Ao contrário, se é o meu desejo que determina o que eu vou fazer e como vou fazer, eu sou livre.

Trecho da entrevista de Marilena Chaui para a revista "Cult"

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