sábado, 20 de junho de 2015

A essência do nosso ser

A essência do nosso ser é o ato de perceber, e a mágica do nosso ser é a consciência. A percepção e a consciência são uma unidade única, funcional e inextricável, mas, uma unidade de dois domínios. O primeiro era a atenção do tonal, isto é, a capacidade das pessoas comuns perceberem e situarem sua consciência no mundo comum da vida cotidiana. O segundo domínio é a capacidade de situar a consciência no mundo não comum, de dar ordem ao mundo não comum. 

O homem tem dois tipos de consciência. A consciência do lado direito e a do lado esquerdo. Lado direito o estado de consciência normal, tudo o que o intelecto pode conceber, onde a primeira atenção prevalece; o lado esquerdo o estado de consciência expandido, um reinado de aspectos indescritíveis, estados de elevada conscientização, o ponto da segunda atenção; o “vidente”. Vidente, aquele que vê, que focaliza sua atenção em determinado tempo e espaço e com isso tem a visão. Ver é uma condição peculiar do saber, de saber alguma coisa sem resquício de dúvida. Esse é o homem de conhecimento. A melhor maneira de adquirir o conhecimento é aprender a utilizar a consciência do lado esquerdo; a consciência expandida, ou consciência intensificada. Ter uma conscientização do lado esquerdo não significa que a pessoa se libere imediatamente de sua loucura – significa apenas uma extrema capacidade de perceber, uma facilidade maior de compreender e aprender, e, acima de tudo, uma maior capacidade de esquecer. A razão da existência é enriquecer a consciência, isso não é uma questão de fé ou de dedução.

A fim de elucidar a segunda atenção é preciso saber qual a ideia de vontade. Vontade pode ser descrita como o controle máximo de luminosidade do corpo como um campo de energia, ou como um nível de eficiência, ou um estado de ser que surge abruptamente na vida diária de um guerreiro a um dado momento. Ela é experimentada com uma força que irradia da parte média do corpo, depois de um instante do mais absoluto silêncio, ou instante de pleno terror, ou de tristeza profunda; mas não depois de um instante de alegria, pois a alegria é muito envolvente para permitir ao guerreiro a concentração necessária para usar a luminosidade do corpo e leva-lo ao silêncio. A tristeza é tão poderosa quanto o terror. Ambos podem trazer o instante de silêncio. Esse negror, esse silêncio, dá surgimento à intenção de dirigir a segunda atenção, de comandá-la, para que ela produza coisas. É por isso que é chamada vontade. A intenção e o efeito são vontade; estão interligados. Não sentimos nossa vontade porque achamos que ela deveria ser uma coisa que fizéssemos ou sentíssemos, como ficar com raiva, por exemplo. Vontade é muito quieta, imperceptível. Vontade pertence ao outro eu. Vontade é um controle tão perfeito da segunda atenção que é chamada de outro eu.

O prazer em qualquer situação associado ao conhecimento representa o verdadeiro poder, a concentração inteligente de energia para que seja liberada apenas nos momentos desejados. (impecabilidade).

O resíduo da consciência, a segunda atenção, era levado à ação, ou erra aproveitado através de exercícios do não fazer. Achávamos que o não fazer o essencial do sonho era um estado de quietude mental, era parar odiálogo interno”, ou o não fazer de falar. A fim de me ensinar como manejá-lo ele costumava me fazer andar quilômetros com os olhos fixos e fora de foco a um nível logo ao fim da linha do horizonte, permitindo assim que eu tivesse uma visão periférica. Seu método era eficiente por dois motivos: permitia-me parar meu diálogo interno, e treinava minha atenção. Forçando-me a concentrar-me na minha visão periférica e de me concentrar por longo tempo em uma única atividade. O melhor método de buscar um sonho era me concentrar na área próxima à ponta do esterno, na boca do estômago. Falou que a atenção que um homem necessita para sonhar deriva-se daquela área, mas que a energia a fim de se mover e procurar no sonho origina-se da área a uns três a seis centímetros abaixo do umbigo. Ele chamava a essa energia de “vontade” ou poder de selecionar, de acumular. Numa mulher tanto a atenção quanto a energia para o sonho originam-se do ventre. Qualquer coisa pode servir para um não fazer para ajudar o sonho, desde que force a atenção a permanecer fixa. Pode ser, por exemplo, olhar as folhas e pedras e formar o seu próprio espírito de não fazer.

Outro assunto altamente significativo era a hora de sonhar. Tarde da noite ou bem cedo de manhã são as melhores horas. Já que a pessoa tem que sonhar dentro de um meio social, deve procurar as condições melhores de solidão e ausência de interferência. A interferência se refere à ligação com a atenção das pessoas e não com a presença física delas.  Não adianta retirar-se do mundo e esconder-se, pois mesmo estando sozinho num lugar deserto, pode prevalecer a interferência dos homens, pois a fixação da sua primeira atenção não pode ser cortada. Temporariamente e apenas localmente, nas horas em que a maioria das pessoas está dormindo, pode-se desviar parte desta fixação por um curto tempo. É nessas horas que a primeira atenção está adormecida. A primeira atenção, a atenção que faz o mundo, nunca pode ser completamente dominada; pode ser apenas desligada por um instante e recolocada pela segunda atenção, desde que o corpo tenha armazenado bastante dela. Sonhar é, naturalmente, um modo de armazenar a segunda atenção.

Cada vez que você olha para alguma coisa em seus sonhos essa coisa muda de forma. O truque é aprender a organizar-se para sonhar. Obviamente não é só olhar para as coisas, mas manter a visão delas. Sonhar é real quando a gente conseguiu focalizar tudo.

Quando conversamos com alguma planta, animal ou rios é um ser mágico que está lhe dizendo algo e que seu corpo foi capaz de entender, como fazem os feiticeiros. É dessa forma que a gente se esgueira entre os mundos; o mundo comum e o mundo mágico. São mundos que podem agir sobre você. Essa é a arte de sonhar.

Sonhar mexer a cabeça devagar de um lado para outro. Os sonhadores usando a sua atenção e focalizando-a sobre os fatos e acontecimentos de seus sonhos normais, transformam esses sonhos em “sonhar”. A técnica é encontrar as mãos nos sonhos e depois prestar atenção, encontrar objetos, em busca de coisas especificas. Daí o grande salto para o “sonhar”. Contemplar as folhas secas e procurar as nossas mãos. Primeiro contemplamos as plantinhas até observarmos a luz delas. Cada sonhador tem um tipo de planta especial para contemplar. Aquietar os pensamentos. Se desligar do nosso diálogo interno.

Os homens não conquistam suas vitórias batendo com a cabeça de encontro dos muros e sim conquistando os muros. Os sonhadores, são ainda melhores, conseguem saltar por cima dos muros; não os destroem. O que é preciso é que cada um tome ciência de seu ambiente no mundo da vida cotidiana.

Corpo sonhador, o brilho da consciência; uma sensação, uma onda de energia que nos transporta e nos transforma. O caminho é encontrarmos a vontade de forma continuada e disciplinada para alcançarmos o ponto de intenção inflexível que nos leve ao silêncio interior, e o silencio interior é a força necessária para alcançarmos a liberdade e realizarmos nossos sonhos. É preciso manter sistematicamente essa posição, agarrando com tenacidade os nossos sonhos e desejos. Com o tempo aprendemos a manter o controle deliberado e a força interior sai enriquecida. O que precisamos é de sobriedade, e só nos mesmos podemos consegui-la. Sem ela nos mantemos na posição caótica dos sonhos comuns e realizações padronizadas.

Como o não fazer de dormir, o sonho dá aos praticantes a utilização daquelas porções de suas vidas gastas no cochilo. É como se os sonhadores não mais dormissem. Mesmo assim não há mal nisso. Os sonhadores não sentem falta do sono, mas o efeito de sonhar parece ser o aumento do tempo através do uso de um pretenso corpo extra, o corpo sonhador. O corpo sonhador é às vezes chamado de “o sósia” ou “o outro”, porque é uma réplica perfeita do corpo do sonhador. É basicamente a energia de um ser luminoso, um esbranquiçado, uma emanação fantasmagórica, que é projetada pela fixação da segunda atenção numa imagem tridimensional do corpo. O corpo sonhador não é um fantasma; é tão real quanto qualquer coisa que lidamos no mundo. A segunda atenção é inevitavelmente levada a focalizar sobre o nosso ser total como um campo de energia, e que transforma essa energia em qualquer coisa apropriada. A coisa mais fácil é, naturalmente, a imagem do corpo físico com o qual já estamos perfeitamente familiarizados em nossa vida diária, através do uso da nossa primeira atenção. O que canaliza a energia do nosso ser total a produzir qualquer coisa que esteja dentro dos limites é conhecido como “vontade”. A nível dos seres luminosos os parâmetros são tão amplos que é bobagem estabelecer limites; desta forma a energia de um ser luminoso pode ser transformada, através da vontade, em qualquer coisa.

Um dia, a fim de aliviar nosso sofrimento por um tempo, sugeri que imergíssemos em sonho. Ao verbalizar minha sugestão, tornei-me ciente de que a melancolia que me perseguia há dias poderia ser drasticamente mudada se eu quisesse mudar.  Compreendi claramente então que o problema com La Gorda e comigo próprio era que tínhamos inconscientemente focalizado o medo e a desconfiança, como se eles fossem as únicas opções possíveis para nós, enquanto todo o tempo tínhamos tido, sem saber conscientemente, a alternativa de centrar deliberadamente nossa atenção no oposto, o mistério, a maravilha que nos tinha acontecido. Dei-me conta de que eu poderia ter dois sentimentos diferentes dentro de mim. Ou podia entrar na cena do sonho e sentir que estava recuperando um sentimento perdido há muito, ou podia presenciar a cena com um estado de espírito usual de minha vida. Quando me afundei na cena do sonho me senti seguro e protegido; quando a presenciei com meu estado de espírito usual me senti perdido, inseguro, angustiado.

Não que eu a tivesse perdoado pelo seu comportamento censurável para comigo, mas era como se nunca tivesse havido traição alguma. Não havia nenhum rancor aberto ou oculto em mim por La Gorda ou por ninguém quanto àquilo. O que eu sentia não era uma indiferença negativa ou negligência ao agir; nem uma solidão desesperada ou nem ao menos o desejo de estar sozinho. Era um sentimento estranho de afastamento; uma capacidade de imergir dentro de mim mesmo por um momento e não ter pensamentos de espécie alguma. As atitudes das pessoas não mais me afetavam, pois eu não tinha mais nenhuma expectativa. Uma estranha paz tinha se tornado a força mestra da minha vida. Eu sentia que de alguma forma tinha adotado um dos conceitos da vida de um guerreiro – desprendimento.

Mas é possível também se sonhar juntos. É perfeitamente possível para um grupo de pessoas ativar as mesmas energias, o mesmo sonho, é como dividir a mesma visão com outros buscadores de conhecimento e sonhos realizáveis. A nossa condição humana pode nos levar a fixar o brilho da consciência. Temos a capacidade de nos juntarmos no conhecimento do lado direito, aquele que nos é imposto pelas regras, costumes e condicionamentos, como também somos capazes de buscarmos o conhecimento do lado esquerdo e realizarmos sonhos juntos.

Outro caminho, e inverso, é desligar todas as tomadas do pensamento o que lhe dará uma sensação de tranquilidade e bem estar. Deixar que o vento lamba delicadamente todo o seu corpo e focar nessa sensação, ou permitir que a água banhe carinhosamente o seu corpo. Para ajudar, deve se escolher um objeto ou algo que lhe traga prazer e focar a sua total atenção nas sensações ou nos objetivos pretendidos. Todo guerreiro tem um lugar de predileção para focar a sua atenção e concentração e não há meio de se escapar do fazer desse mundo. O que se deve fazer é transformar seu mundo em um terreno de caçada. Como caçador, um guerreiro sabe que o mundo foi feito para ser usado. Portanto, usa cada pedacinho dele. Um guerreiro é como um pirata que não tem dúvidas em pegar e usar o que quiser, só que o guerreiro não se importa, nem se sente insultado, quando é utilizado e apanhado ele mesmo.

Parar o diálogo interno, entrar no estado de silêncio interior é o caminho para acharmos o profundo amor. Para tanto temos que aprender a exercer a vontade. A vontade séria e profunda que estabeleça uma real, clara e verdadeira intenção, uma nova ordem. A vontade é diretamente ligada a três pontos: sentir, sonhar e ver; só depois desses pontos é que deve vir a razão. Esta, propriamente, é um centro menor do que a vontade; só está ligada a falar, a criar ruídos. O diálogo interno para do mesmo modo que começa: por um ato de vontade. Quando aprendemos a conversar com nós mesmos, aprendemos a manipular a vontade de forma que focalize a intenção com profundidade para que realizarmos os nossos sonhos, ou desejos. Desde quando crianças somos “educados” a repetir diálogos infinitos que ficam internalizados e com isso somos aprisionados e levados ao um estado de grande agitação. Ficamos impregnados de ideias que muitas vezes não são as nossas. A busca do conhecimento é aprendermos a quebrar esse ponto de aprisionamento para alcançarmos a tão procurada liberdade. Muitas crianças, antes desse aprisionamento de ideias, têm a capacidade de veem.  Quando elas têm a capacidade de verem são imediatamente consideradas esquisitas e todos os esforços são feitos para corrigi-la, para fazê-las consolidar no aprisionamento de ideias e noções preestabelecidas, corrompendo a liberdade de expressarmos e experimentarmos qualquer coisa que fuja do que os mais velhos considerem como aceitáveis. Somos ensinados desde pequenos a perder a fluidez infantil e condicionados a acompanhar as garras da racionalidade; obrigados a seguir uma ordem preestabelecida, enterrando definitivamente o que seria a liberdade procurada. Por isso o experimento dos frutos da árvore do conhecimento foi considerado pecaminoso. Para pararmos o diálogo interno, a que fomos condicionados, é preciso uma tremenda disciplina para fazer retornar a consciência do lado esquerdo para readquirimos o estado de consciência expandido que nos foi tirado pela forma de ensinamento condicionada, racional e repetidora. Estarmos sozinhos sem a ajuda de ninguém é um passo importante pois todos nós temos certas ideias que devem ser quebradas para que sejamos livres. Entra nesse estado é estar livre de suposições racionais e medos racionais. Para baixar a intensidade e quantidade de ruídos no pensamento é necessário suspender todo e qualquer julgamento. Isso se chama parar o mundo. Focar a atenção no umbigo e mentalmente massagear essa região fará com que você substitua pensamentos ruins e outros ruídos e fará você sentir uma estranha sobriedade.     Parar o mundo é uma técnica em virtude do qual, quando temos medo, assombro, poder e a sensação da morte, o mundo como o conhecemos é levado a desmoronar.

Quando a gente não tem mais nada a perder torna-se corajosa. Só somos tímidos quando ainda temos alguma coisa a se agarrar. Portanto, todo caso fatal, tem poder.


Comtemplar é fazer um zoom após parar o diálogo interno.

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