A estratégia da direita brasileira é promover um verdadeiro cerco ao governo Dilma, retirando, ao máximo, a legitimidade da vitória eleitoral de Dilma.
por Vinicius Wu
Em 2011, após enfrentar uma onda de greves e protestos contrários às
medidas de austeridade impostas pela União Europeia, o governo da Grécia
resolveu convocar uma consulta popular, através da qual a população
decidiria pela adesão – ou não – ao plano de resgate acertado com o
Banco Central Europeu (BCE), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a
Comissão Europeia.
Após o anúncio, pelo governo de Georgos
Papandreou, da proposta de consulta, o mercado financeiro rugiu, os
presidentes de França e Alemanha ameaçaram, a mídia europeia condenou
veementemente e a Grécia voltou atrás, anulando o referendo e retirando
de seus cidadãos o direito à definição de seus destinos. Encurralado e
sem apoio parlamentar, Papandreou renunciou ao cargo.
Já em 2012,
Fernando Lugo, presidente democraticamente eleito pela população do
Paraguai, foi deposto num processo que teve início numa quinta-feira e
foi concluído – em tempo recorde – na sexta-feira da mesma semana. Um
caso digno de registro no Guinness. Os demais países que compõem a
Unasul condenaram o golpe, em comunicado oficial, na fatídica tarde de
22 de junho de 2012. Em vão.
Uma combinação de perda de apoio no
Congresso, ativismo político do Judiciário, disposição golpista de
partidos de oposição e cerco midiático gerou o ambiente para a
destituição de Lugo e o resto, como sabemos, é história.
Assim,
tanto na Grécia, quanto no Paraguai, foi possível – através de uma
sofisticada articulação política entre mídia, sistema financeiro,
governos e partidos conservadores – derrotar a soberania de nações
independentes e impor a agenda de uma minoria. São casos recentes, em
ambos houve alguma indignação, mas a humanidade logo seguiu seu rumo e a
vida voltou ao normal.
Esse é um novo tipo de golpe sobre a
democracia. A fórmula pode variar, mas a essência é a mesma: governos
que adotem medidas contrárias aos interesses do capital financeiro – por
mais tímidas que sejam – estão sujeitos a pressões de toda ordem e, em
casos extremos, pode lhes custar o mandato.
São golpes dentro da
democracia, por isso sequer entram para os livros de história com esse
nefasto nome. Mas o são na medida em que os interesses de uma minoria
ínfima da sociedade se impõem ao seu conjunto, bloqueando ou mesmo
interrompendo a institucionalidade democrática em nome dos mesmos.
Claro
que são casos distintos, repletos de singularidades. Porém, é evidente
que a agenda do atendimento irrestrito às exigências de austeridade e
respeito aos mercados conta com uma rede potente, em diversos países,
que envolve mídia, especuladores, partidos políticos, intelectuais
domesticados e setores do judiciário.
Creio que seja o caso de
nos perguntarmos se a fórmula pode, ou não, se reproduzir no Brasil,
evitando exageros e sem nos perdermos em teorias conspiratórias, que
mais paralisam do que contribuem para a ação crítica.
A
estratégia da direita brasileira – serviçal do capital financeiro e
orientada politicamente pelos grandes monopólios de mídia – é promover
um verdadeiro cerco ao governo Dilma. O que pretendem é retirar, ao
máximo, a legitimidade da vitória eleitoral da atual presidenta, fazer
com que o governo se arraste por quatro anos e desmoralizar o PT e
demais partidos do campo popular.
Desde o final do segundo turno,
a grande mídia e os partidos identificados com a agenda neoliberal tem
deixado claro que só apoiarão medidas que correspondam à pauta dos
bancos. De resto, será oposição sistemática, com direito à convocação de
ato com inclinação golpista pelo próprio candidato derrotado, Aécio
Neves.
Não me parece que a direita brasileira tenha – pelo menos
até aqui – força social e política suficiente para derrubar Dilma. Mas
fica cada vez mais evidente que essa saída faz, sim, parte da agenda de
setores da oposição. E o PSDB flerta, abertamente, com o golpismo, ainda
que esteja, aparentemente, dividido.
O atual momento político é
complexo demais para soluções simplistas. Não me parece haver qualquer
tipo de fórmula mágica no horizonte. Mas o PT e demais partidos de
esquerda devem levar em consideração a dinâmica sinuosa do golpismo
contemporâneo a fim de evitar o pior. A política no Brasil nunca foi
terreno fértil para amadores.
http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Golpismos-contemporaneos/4/32398
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