O ciclo de protestos iniciado em junho de 2013 estampou o racha que persiste no Brasil desde a sua colonização.
A tentativa de manipulação das intenções desses movimentos fez com
que muitos acreditassem que eles marcariam uma virada conservadora no
país. Isso provavelmente ocorreu pelo histórico de que grandes
mobilizações de massa provocam guinadas à direita como ocorreu mais
recentemente no Egito, Grécia e Espanha. Esqueceram, no entanto, que
aquelas populações que abandonaram a esquerda o fizeram porque seus
governos aderiram às políticas de austeridade, à falta de regulação do
capital, e abandonaram as suas políticas distribuição de renda e geração
de emprego.
Tais governos são os que optaram para abraçar o pragmatismo e aderido
ao mote de que não mais existem diferenças entre esquerda e direita.
Esse quadro favoreceu a ideia de que as opções entre as políticas de
esquerda e direita se tornassem suficientemente indistintas o que abriu a
possibilidade da vitória da direita.
Os conhecidos manipuladores bem que tentaram embaralhar tais
diferenças ao elevar os motes de “falta de representatividade” e a busca
pelo “novo” como foco central dos movimentos. Mas este fenômeno não foi
criado por junho: ele vem de antes e está, inclusive, entre as causas
que explodiram nos protestos. Ele chega às eleições de 2014 seguindo uma
curva linear ascendente que há uma década se alimenta do denuncismo
seletivo, dos ataques diários da mídia e da irresponsável omissão das
obras e projetos realizados pelo governo.
Esse foi o debate eleitoral.
Só que crises de representação em geral são provocadas na prática por crises
de projeto político. Essas sim podem se resolver com a alternância no
poder. E aqui, mais uma vez, a população ao escolher pela terceira vez
um mesmo partido, demonstrou que não procura a mudança dos projetos que
veem serem tocados pelo atual governo.
Da mesma forma que a tentativa de encampar o “novo”, inicialmente
pela candidatura de Marina Silva e posteriormente pela de Aécio Neves,
não surtiu os resultados esperados. A população demonstrou nas pesquisas
realizadas logo após os movimentos do ano passado que queriam mudanças
mais dentro do projeto desenvolvido pelo governo do PT, o que soaria
melhor como avanços. Essa vontade da população foi confirmada nos
resultados das urnas tanto no primeiro como no segundo turnos das
eleições.
Se alguns segmentos da esquerda demonstravam algum descontentamento
pela lentidão de avanços mais progressistas, a possibilidade estampada
pela ascensão de Aécio Neves e tudo o que representa os seus grupos de
apoio e a ameaça da volta da direita ao poder foi bastante para
reaglutinar as forças comprometidas com o avanço da nossa democracia. A
população optou por não correr o risco de perder as conquistas dos
últimos doze anos.
Mais uma vez as eleições deixaram claro que entre os eleitores a diferença entre esquerda e direita persistem.
No entanto, as margens dos votos demonstram haver necessidade de
correções de rumo para que os movimentos de estampar crises não cresçam.
O próximo governo de Dilma terá que delimitar os espaços para que as
diferenças programáticas não se tornem suficientemente pequenas ao ponto
de colocar em risco o projeto que vem sendo realizado.
É preciso que o governo e o próprio PT voltem a abraçar e promover as
grandes reformas, o que representa enterrar de uma vez a cultura da
“casa grande e senzala”, nem que tal movimento produza conflitos
setoriais.
Não é mais possível manter o comprometimento de não se modificar o status quo.
Esse momento torna impossível a continuidade do bem-sucedido "pacto
lulista" do crescimento acelerado com distribuição de renda, em que os
ricos ficam mais ricos e os pobres, menos pobres. O governo precisará
encontrar força e disposição para criar uma repactuação para que a corda
não volte a arrebentar do lado mais fraco e para que o país volte a
crescer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário