Por Andréa Mota
Quando
Joaquín Salvador Lavado, mais conhecido como Quino, criou a menina de
seis anos, ele sabia o que estava fazendo. Para contestar erguendo uma
voz destoante da harmonia costumeira, era preciso tratá-la de outra
forma. Malfada Quino não pediu para nascer e tinha todos os argumentos
para considerar aquele mundo difícil, irregular e, sobretudo,
injusto.Seu primeiro esboço foi criado em 1962 como um cartoon de
propaganda do Diário Clarín, na Argentina, que não vingou. Naquele
período, os argentinos assistiam a iminente ditadura que lhes consumiria
direitos e um bom descanso no fim do dia. De 1966 a 1973, a “revolução
argentina” liberou a porteira para multinacionais e trouxe aos
trabalhadores argentinos rombos constitucionais expressivos. Condenou as
universidades por subversão e ideias comunistas, destruiu bibliotecas e
engatilhou as armas que seriam usadas em chacinas como o Massacre de
Trelew – fuzilamento de guerrilheiros rendidos. Mafalda
nasceria mesmo em 1964, quando foi publicada pelo semanário Primeira
Plana. Nos primeiros esboços, era apenas ela e seus pais. Filipe
apareceu em janeiro do ano seguinte. Com uma notoriedade em ascensão,
Mafalda começou a aparecer no El Mundo, de Buenos Aires, e trouxe
consigo mais dois personagens: Manolito e Susanita. Em 1967, quando a
mãe da menina estava grávida, o El Mundo fecha suas portas e as janelas
de Mafalda, que ficou seis meses no escuro.No novo espaço, Siete Días
Ilustrados, Quino não conseguia acompanhar as notícias em consonância
com suas tiras, já que tinha que entregar o material duas semanas antes
da publicação. Resultado: Mafalda deixa seu espaço vazio em 1973. A
justificativa do cartunista, na realidade, era a preocupação de se
repetir. Segundo o próprio Quino, ele já havia conseguido falar o que
queria.E
assim, Mafalda se foi. Na verdade, não. A expressividade da menina foi
tanta que ela ganhou vida própria. Em 1982, Carlos Márquez colocou em
prática a Mafalda em desenho animado, para pouco gosto de Quino. Mas,
diferente de seu nascimento, o novo formato não ficou tão conhecido. HistóriasA
universalidade e, porque não dizer, atemporalidade dos pensamentos de
Mafalda é evidente. O que move a menina de cabelos cheios e vestido
vermelho é o questionamento de coisas óbvias, mas tão esquecidas pela
sociedade preocupada com sua econômica forma de vida. Para auxiliar
Mafalda em seus porquês, Quino criou personagens memoráveis:Papá:
o pai de Mafalda. Ele trabalha em uma companhia de seguros, cultiva
plantas no quintal e tem crise de idade.Mamã: a mãe de Mafalda. Sem
completar os estudos, ela é considerada a típica dona de casa e, muitas
vezes, considerada medíocre pela menina. Seus principais embates são,
sobretudo, pelo ódio de Mafalda por sopa e macarrão.Filipe: Inspirado no
jornalista e amigo de Quino, Jorge Timossi, Filipe é um garoto em
conflito. Ao mesmo tempo em que odeia a escola, ele não consegue tirar
de si o senso de responsabilidade e, por isso, tem crises de consciência
constantes.Manolito: Este personagem representa o conservadorismo
capitalista. Filho de comerciante, ele vive preocupado com os negócios,
os juros e lucros. Só se dá bem em matemática na escola e odeia os
Beatles.
Susanita: É aquela amiguinha que a gente não larga, mas
podia algumas vezes ficar calada. Seu sonho é casar com um cara rico e
ter muitos, muitos filhos. Além disso, ela adora se ocupar da vida dos
outros.
Guille “Gui”: Irmão mais novo de Mafalda, é curioso e
está começando a conhecer o mundo.Miguelito Pitt: Um garoto meigo, de
coração bom, mas demora em entrar nas ligas da menina. É um pouco
egoísta e, muitas vezes, acha que a vida gira em torno de si.Libertad:
Uma menina com pais idealistas e simples. Vive ouvido comentários sobre
seu nome.Burocracia: Nada mais bem adequado que esse nome, afinal, é uma
tartaruga. Mafalda batizou tartaruguinha por achá-la vagarosa. Que
coisa.Sopa: Brincadeirinha. A sopa pode ser apenas um alimento, mas
sempre irritou Mafalda. Portanto, estamos diante de seu arqui-inimigo.QuinoNão
se pode deixar de registrar a genialidade de Quino em outros trabalhos
pós-mafalda. De um humor preciso em fazer rir e pensar, o cartunista
perdeu a mãe muito cedo e foi cuidado pelo pai. Joaquín Salvador tem o
apelido de Quino desde a infância, para diferenciar-se do tio homônimo.
Entrou para a Faculdade de Belas Artes e, desde então, começou a vender
seus desenhos até chegar à personagem de maior sucesso. Mafalda chegou
ao Brasil em plena ditadura, em 1973, pela revista Patota, da editora
Artenova.Alguns trabalhos
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