sábado, 4 de agosto de 2018

PT do pedestal

A direção do PT precisa ter humildade e descer do pedestal para fazer sua análise e reconhecer que foi derrotado pela forças que optou por trazer para dentro do seu próprio governo.

Talvez estejam certos alguns analistas quando atribuem às esquerdas a alcunha de "polianas".

A história das esquerdas, no Brasil, está recheada de ter tomado uma série de golpes. Nada pode justificar a leniência deste segmento popular sobre os  acontecimentos nas últimas duas décadas que não seja atribuído ao sentido "poliana" dos seus dirigentes, ou arrogância e prepotência sem limites.

Tudo parece começar ainda em 2002, quando ao tempo em que Lula vencia as eleições, o PT sofria uma derrota política ao aceitar a tal "Carta ao Povo Brasileiro", onde o presidente eleito se comprometia a não mexer com a política que beneficiava o sistema financeiro. E tanto cumpriu com a promessa, que Lula em algumas ocasiões devolveu a cobrança da elite afirmando que os banqueiros nunca tinham ficado tão ricos quanto no seu governo.

O PT e a ala da esquerda do governo Lula não percebiam que mesmo cumprindo o pacto da "Carta ao Povo Brasileiro,  ainda assim ocorria reclamação do mercado. O apoio foi, desde o início, uma jogada farsante da direita, sabendo que a eleição de 2002 seria ganha, indubitavelmente, pelo candidato do PT.

Ainda nessa fase da primeira derrota do governo Lula e do PT, há um fato que provocou um grande desgaste interno no partido. Foi a queda de braço do grupo mais forte do PT, que por um lado queria aumentar as "negociações" com Daniel Dantas e do outro lado o saudoso Gushiken que titanicamente conseguiu impedir o avanço das negociatas para dentro dos fundos de pensão, como reportou a revista "Carta Capital" que disse:

"Havia uma divisão dentro do governo do PT. De um lado, o ministro Antonio Palocci era simpático à causa de Dantas. De outro, o ministro Luiz Gushiken, aliado dos fundos de pensão, era terminantemente contra."
https://www.cartacapital.com.br/politica/dirceu-e-o-mensalao

A segunda grande derrota de Lula e do PT, também ocorre como consequência do pragmatismo abraçado pelos chamados "governistas" do partido. Era o ano de 2005, quando começavam as primeiras denúncias do mensalão do PT. Para evitar consequências maiores e blindar o presidente Lula das gravíssimas denúncias no âmbito do chamado mensalão, o governo desesperadamente se abre para ampliar o seu leque de apoio, compondo com a outra ala do PMDB que na campanha presidencial tinha se alinhado ao candidato opositor. O governo Lula fica completamente agastado e entregue ao maior núcleo do corrupção destes país, que por força dos sordidos tentáculos das suas relações com a sociedade empresarial e financeira corrupta deste país, fez parte de todos governos brasileiros, pelo menos desde 1964; o chamado "centrão". Essa foi a armadilha deixada pelo governo Lula para Dilma que em do governo pouco pode fazer para desfazer o nó e reagrupar as forças mais democráticas.

Assim, chega ao governo o exato grupo que mais tarde faz a traição e desfere o golpe da derrubada de Dilma. É o grupo de Geddel que se torna, no início de 2007, Ministro da Integração de Lula, para surpresa e choque dos petistas baianos que conheciam muito de perto a veia falsa e traiçoeira de Geddel. Na mesma leva, Jucá que ainda em 2005 se torna ministro da Previdência Social do governo Lula, Moreira Franco que com Dilma se torna duas vezes Ministro, entre outros. A derrubada do governo do PT estrava em gestação.

A terceira grande derrota do governo e do PT se dá quando, já totalmente dominado por grupos conservadores, perde o comando do Congresso para Eduardo Cunha. Dilma, pelas coligações pragmáticas deixadas por Lula, tinha pouca ingerência no seu própio executivo, e, agora, perdia qualquer possibilidade mínima de convergência com o legislativo.

A quarta grande derrota do governo do PT, se dá quando Dilma, no início do seu segundo o governo, é coagida pelas forças de mercado que já vinham fortes nos governos do PT desde que Lula abriu seu governo para a banda mais podre do PMDB e cede, colocando na sua principal pasta da área econômica um homem de mercado, Joaquim Levy. Aqui é a senha para o golpe.

Sem força dentro do seu próprio governo, com o legislativo verdadeiramente inimigo, uma mídia nitidamente de oposição, e um STF extremamente fraco, fruto das irresponsáveis escolhas de Dilma e Lula,  acantando indicações à torto e à direita, e ainda pior do que estas condições apontadas está a perda do apoio organizado da forças populares, pelo, e isso é nítido e claro, distanciamento dos governos populares da suas bases; não há outra explicação.

A quinta grande derrota foi a soberba de se manter a candidatura de Lula mesmo com todas as ações de golpe acima enunciados, dificultando composições e isolando o PT. A consequência os observadores mais atentos já sabiam seria a continuidade do golpe com a manutenção da condenação e prisão de Lula, o tempo curto que sobraria para alavancar a campanha do sucessor de Lula como candidato e a derrota do partido nas eleições.

O PT precisa descer do pedestal para reconhecer que a derrubada do seu governo se deu por seus próprios atos nas escolhas erradas. Tem que parar de se fazer de vítima e deixar de colocar a culpabilidade em terceiros.

O PT precisa deixar de se fazer de "poliana" para aceitar que a semente do golpe foi plantada no primeiro governo de Lula, gestada no seu segundo governo, geminada no governo de Dilma.

O PT precisa reconhecer que o poder lhe conferiu um estado de inércia geracional e conformismo pragmático que levou suas bases à apatia. Não é possível explicar de outra forma o julgamento sem provas de Dirceu, a derrubada do seu governo eleito (Dilma) - a mais grave ofensa para um estado democrático de direito, a usurpação do sufrágio universal - sem que o país tivesse parado completamente, sem a luta aguerrida dentro do congresso, bloqueando votações, denunciando ininterruptamente o golpe, deixando saudades, muitas saudades, do tempo que nós tivemos um PT ligado às populações, às organizações base, de sangue nas ventas e fortemente aguerrida dentro dos debates, sobretudo dentro do Congresso.

É preciso que o  PT reconheça definitivamente que um golpe foi dado, e deixar de ficar fazendo jogo do "faz de conta", o jogo de cena, como se estivéssemos atravessando ainda uma democracia. Se tivesse reconhecido o movimento do golpe desde lá de trás, como apontamos aí durante o texto, o partido e seus aliados teriam resistindo muito mais fortemente, reagindo ao seus erros, e procurando outros rumos para solucionar os seus problemas, ao invés de ir cada vez mais se comprometendo com o "sistema", o próprio 'sistema" que o traiu, o engoliu e o derrubou.

Se um golpe foi dado, e de maneira tão sem resistência,  praticamente aceitado (por ação ou omissão) por todos os segmentos da sociedade, não será em 2 anos de usurpação, sob hipótese alguma, que o "sistema" e os golpistas deixarão retornar o poder para o seu grupo oposto. O PT parece não acreditar no Golpe,  estão lutando com armas apropriadas apenas para situação de normalidade democrática.

Um golpe não é um ato pronto e acabado.
Ele não surge do nada. Ele é fruto de precariedades.

Todo golpe é um ato continuado. Por isso muitos falam de golpe dentro do golpe.
Se preciso, para impedir qualquer possibilidade de vitória de uma candidatura do PT,  novos atos golpistas serão implantados, além de todos o que aconteceram recentemente, enquanto o PT ficava com "cara de paisagem".

O PT precisa botar a bola no chão e não ficar se vangloriando com o fato de que Lula tem 36% de preferência do eleitorado -  dados inquestionáveis -  no entanto, essa preferência popular pelo Lula é uma força disforme e desorganizada. O PT perdeu a característica da aglutinação da base, tanto que não conseguimos botar nem 100.000 pessoas para defender o governo de Dilma ou contra a condenação de Lula, enquanto a direita botou milhões nas ruas do Brasil para derrubar a presidenta. Não é lá, tão confortável assim,  esses índices de preferência à Lula. Não sabemos, com ele preso, de que forma ele conseguirá realizar algo que já difícil em situação normal, a transferência de votos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário