sábado, 4 de junho de 2016

Mídia Pública X Mídia Mercantil

O neoliberalismo tratou de impor a polarização entre estatal x privado como o centro do campo teórico do nosso tempo. Como quem reparte, fica com a melhor parte e esconde a parte que mais lhe incomoda. É o que acontece com essa falsa polarização.

O neoliberalismo destruiu o Estado e diz: se quiserem, defendam esse Estado destruído. Senão, venham para a esfera privada.

Para começar, a esfera neoliberal não é a esfera privada. Esta é a esfera individual, das liberdades pessoais, que justamente é esmagada pelo domínio do mundo do dinheiro. É uma boa cobertura para o neoliberalismo esconder sua verdadeira esfera: a esfera mercantil.

O neoliberalismo, como forma exacerbada de capitalismo, busca transformar tudo em mercadoria, instalar uma sociedade em que tudo tem preço, tudo se vende, tudo se compra. Que a educação não seja um direito igual para todos, mas uma mercadoria, em que quem pode, compra, quem pode mais, compra melhor. Assim como a saúde, a cultura, o transporte, etc, etc. A esfera do neoliberalismo é assim a esfera mercantil, em que o sujeito é o consumidor.

O shopping center é a utopia do neoliberalismo, um não-espaço, conforme a categoria da antropologia, sem janela e sem relógio, em que cada um, quando entre nesse espaço, rompe com sua cidade, seu país, para ser absorvido pelo mundo das marcas globalizadas. Em que se perdem as identidades locais, sejam gastronômicas ou artesanais, para se impor a homogeneidade globalizada.

A esfera contraposta à mercantil é a esfera publica, que o neoliberalismo procura esconder. É a esfera dos direitos, em que o sujeito é o cidadão – cuja definição é exatamente “sujeito de direitos”.

O Estado é um espaço de disputa entre as duas esferas. Normalmente as duas estão presentes no Estado, que pode ser hegemonizado por uma ou por outra.

No plano da comunicação essa polarização se reproduz nas suas formas específicas. A mídia privada é a expressão dos interesses mercantis na sociedade, patrocinada por eles e as próprias empresas sendo movidas pelo lucro e pela propaganda gerenciada pela agencias.

A mídia pública não se confunde com a estatal. Ela defende os direitos de todos à informação e à opinião, é a expressão democrática na sociedade. Ela pode ser financiada por recursos públicos ou ser uma instituição publica não-estatal. As mídias alternativas são o melhor exemplo deste caso: pertencem à esfera publica, mas não são estatais.

O Brasil de hoje está dominado pelo  enfrentamento entre os interesses mercantis e os interesses públicos. O governo golpista busca enfraquecer os direitos – seja no SUS, no Minha Casa, Minha Vida, no Bolsa Família, na escola pública, no pré-sal, nas mídias publicas, nos direitos das mulheres, dos negros, dos indígenas, dos jovens, das distintas identidades sexuais, no plano da comunicação. A luta de resistência ao golpe busca impedir esses retrocessos e derrubar esse governo, impondo uma mídia democrática, pluralista, representante da diversidade da nossa sociedade.

A mídia mercantil tornou-se um dos maiores protagonistas do golpe, aliada aos partidos de direita, às associações do grande empresariado. A mídia pública se alinha na luta democrática, expressa nas maiores manifestações populares que o Brasil ja viveu.

As tentativas de intervenção na EBC estão no centro dessas disputas, com o governo tentando tirar o caráter publico da entidade, impondo-lhe o selo estatal -  “governista”, como a direita gostava de acusar anteriormente. Em particular a TV Brasil, a Radio Nacional, são expressões claras de uma mídia pública, diversa, plural, independente do governo, articulada com a luta e afirmação dos direitos de todos na sociedade brasileira. Aí se decide muito do futuro do pais, porque sem formação democrática da opinião publica, não há democracia.

Por Emir Sader
No Brasil 247

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