sexta-feira, 25 de março de 2016

Cenário espinhoso e escolhas difíceis

Estão em jogo na cena política nacional interesses poderosíssimos de setores empresariais internacionais e do país. São alvo, das aves de rapina, importantes garantias constitucionais, como os mínimos orçamentários destinados para a saúde e a educação; a privatização eventual da Petrobras e a entrega do pré-sal ao capital estrangeiro; a intensificação do controle policialesco sobre os movimentos sociais, as classes populares; assim como direitos trabalhistas no regime celetista e estatutário.

Poderosas frações empresariais almejam retirar o que resta de direitos sociais e privatizar o parco patrimônio público de interesse nacional, ainda sob o controle do Estado. A agitação judicial, política e midiática possui esse pano de fundo, precisamente em um contexto em que as exportações caíram bastante e não há como compatibilizar interesses, mesmo que muito desiguais, entre empresários e trabalhadores. O empresariado - a Fiesp, não gratuitamente, é o símbolo do movimento de sabor fascistóide e contra a legalidade - quer o controle absoluto do Estado. Pretende abocanhar todos os recursos orçamentários. Está sedento por isso.

O PT e a presidente Dilma não são "confiáveis", sob a ótica dos capitalistas, seja para acelerar o processo, seja para adotar determinadas medidas. Contudo, o governo petista tem posto em prática inúmeras reivindicações e ideias empresariais, como a lei antiterrorismo - cujo alvo são os movimentos sociais - e um ajuste fiscal que retira direitos dos trabalhadores e dos servidores públicos, inclusive estaduais. Outro dia mesmo, fez acordo com o tucano José Serra, para aprovar seu projeto de entrega do pré-sal ao capital estrangeiro.

Os servidores do Estado do Rio de Janeiro estão envolvidos em contínuos protestos desde o final do ano passado. Encontram-se em greve professores de escolas e universidades há quase um mês. Por conta das medidas anunciadas pelo Ministério da Fazenda, de renegociação das dívidas estaduais, professores e servidores estaduais tornaram-se um alvo óbvio: desinvestimentos nos órgãos e serviços públicos; congelamento salarial ad eternum; aumento da contribuição previdenciária etc.

Os servidores no Rio de Janeiro ficaram cercados, agora, com a decisão federal, que vai impulsionar o projeto draconiano do governador Pezão (PMDB) na Alerj, que suprime investimentos nos serviços públicos. As expectativas dos servidores, em meio aos protestos e à greve, se já não eram boas, agora, então...

O cenário é complicadíssimo e espinhoso para quem é de esquerda. De um lado, uma ameaça real de ascensão de movimentos e iniciativas de caráter fascista e ultraprivatizante, que querem ilegalmente a destituição de uma presidente cuja probidade pessoal, até o momento, é inatacável. De outro, a Presidência intensifica suas tentativas de manter-se, acolhendo valores e medidas antipopulares e antinacionais. Medidas abertamente nocivas aos interesses dos trabalhadores e do país. O mui tímido programa favorável ao povo, que havia sido defendido na eleição, a presidente Dilma colocou para escanteio há bastante tempo.

Trata-se, pois, de um cenário espinhoso e delicado, que demanda a formação de algum tipo de frente social e política. Uma frente antifascista demandaria a integração de muitos setores, tendo que se subordinar a uma pauta econômica ultraconservadora, implementada pelo governo e defendida, de maneira mais radicalizada, pelos próprios golpistas.

Seria uma frente com alguma viabilidade de conter os personagens fascistóides. Mas, sem qualquer expectativa de assegurar direitos trabalhistas e garantias constitucionais, que efetivamente dão uma certa, mesmo que pálida, tonalidade democrática ao Brasil.
Uma frente de esquerda, tão necessária há tempos, seria uma possibilidade de posicionar-se contra o golpismo, mas com autonomia em relação à agenda defendida pelo governo federal. Guardaria capacidade, no entanto, de envolver número inferior de adeptos e setores da sociedade. Contudo, poderia ser uma oportunidade para elaborar uma plataforma programática comum e posicionar-se efetivamente na cena pública nacional, para além da estreiteza corporativa de movimentos sindicais e estudantis.
Organismos populares, como o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), e partidários, como o Partido Comunista Brasileiro (PCB), oportunamente, têm buscado a articulação de uma frente de esquerda, chamada Povo Sem Medo - Frente Nacional de Mobilização. Na quinta-feira (24/03) serão realizados protestos em diferentes cidades (1).
Poucas possibilidades em aberto e muitas dúvidas. Tudo muito nebuloso e espinhoso. Certeza mesmo só o perigo ultraprivatista e fascistóide. Outra certeza é que nas duas eventualidades de frente antigolpista a maior parte do povo estaria de fora, contando, principalmente, com camadas médias e altas das classes trabalhadoras e frações das classes médias. Essa é a pior faceta do problema todo, com o "povão", em elevada medida, lançado ao limbo. Exatamente isso precisa ser revertido. Com urgência. Entretanto, a mais segura certeza é que “é preciso estar atento e forte”. É preciso lutar.

Roberto Bitencourt da Silva, historiador e cientista político.

(1) Ver: https://www.facebook.com/povosemmedonacional/?fref=ts

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