O mundo doido dos grandes conluios e complôs 
Por: Dean Burnett, no jornal The Guardian
Nada melhor que uma boa conspiração para acalmar o medo do 
desconhecido. Para dar sentido ao inaceitável ou ao inexplicável, os 
homens precisam de explicações. Por mais loucas que sejam...
Com as sucessivas revelações sobre o programa de espionagem Tempora 
do Governo britânico (sobre informações trocadas na internet) e a ameaça
 de guerras (na Ucrânia e no Médio Oriente), a época atual é propícia 
para as teorias da conspiração.
É como quando vamos à rua pôr o lixo no latão e reparamos num saco de
 papel esquecido: nós o agarramos e ele, de tão velho, rasga-se 
derramando seu conteúdo no chão. E, de repente, ficamos cercados por um 
enxame de moscas furibundas; corremos para dentro aos gritos e passamos 
três horas na ducha, tremendo. Para mim, as teorias da conspiração são 
um pouco isso.
Aparentemente eu próprio estou envolvido em várias conspirações. 
Quando a televisão inglesa Channel 5 emitiu um programa sem qualquer 
sentido crítico sobre a conspiração lunar (os primeiros passos do homem 
na Lua seriam uma farsa do Governo norte-americano e teriam sido 
filmados num estúdio], respondi “confessando" que era verdade e 
inventando outras conspirações “autênticas ", para demonstrar a que 
ponto a ideia era ridícula.
Imaginei conspirações tão disparatadas que pensei que ninguém ia 
acreditar - o que só prova a minha ingenuidade sobre aquilo de que as 
pessoas são capazes e aquilo em que estão dispostas a acreditar. E, como
 seria de esperar, disseram logo que eu tinha procedido assim por estar 
sendo manipulado pelos autores da conspiração lunar...
O que leva as pessoas a ver conspiração em situações relativamente 
menores (como um texto num blog insignificante  como o meu)? Não vale a 
pena analisar todos os elementos conhecidos a esse respeito. Isso não 
muda nada e, provavelmente, não viverei o suficiente para ver as 
conclusões. Mas há muitas razões pelas quais as pessoas se deixam 
apanhar por conspirações e muitas explicações para o fato de essas 
teorias se tornarem tão complexas e persistentes.
Não devemos ignorar os teóricos da conspiração, chamando-os de 
“excêntricos" ou de “malucos” - ou qualquer outro qualificativo que faça
 com que não sejam levados a sério. Um teórico da conspiração pode agir 
por efeito de perturbações mentais: ansiedade, paranoia, psicose. Entre 
outras. O seu estado pode não ser grave a ponto de exigir intervenção 
médica: ou pode o seu envolvimento numa teoria da conspiração ser uma 
maneira de controlar os sintomas, ou seja, uma forma de automedicação. A
 menos, claro, que a própria psiquiatria seja uma conspiração...
Contudo, perturbações mentais e teorias da conspiração nem sempre 
estão diretamente relacionadas: pode se acreditar na versão oficial do 
assassinato de Kennedy e ser-se completamente esquizofrênico.
A necessidade da pertença
Mais preocupante é o fato de haver estudos que demonstram que o cidadão comum é muito receptivo a teorias da conspiração.
Há muitas razões para isso, incluindo a tendência dos seres humanos 
para a pareidolia (tentativa de discernir motivos e padrões em fenômenos
 acidentais; por exemplo, quando vemos rostos e expressões humanas em 
formas aleatórias como nuvens, troncos de árvores, redemoinhos de água, 
etc). Então, por quê? Será que as teorias da conspiração respondem a 
necessidades básicas dos seres humanos? Segundo a pirâmide de Maslow, as
 necessidades humanas mais básicas são fisiológicas (alimentação, 
abrigo, etc). Nas sociedades ocidentais, temos a sorte de essas 
necessidades estarem, de uma forma geral, garantidas. Vem depois a 
necessidade de segurança. Como o medo anda muitas vezes de mãos dadas 
com o desconhecido, ter "conhecimento" das conspirações e maquinações 
urdidas por figuras misteriosas pode tornar-se útil.
Segue -se a necessidade de “pertença". Os seres humanos são criaturas sociais, têm necessidade de ser aceitos pelos outros.
As redes das teorias da conspiração surgem, para os seus adeptos, 
como grupos de amigos. O que leva ao nível seguinte: a necessidade de 
realização, de reconhecimento e de respeito. A descoberta de ligações e 
provas que sugerem a existência de conspirações ou de manobras para 
encobrir um caso garante que atraímos para nós as felicitações do grupo 
conspirador a que pertencemos.
Essa necessidade de pertença a uma comunidade pode também explicar a 
razão pela qual algumas teorias conspirativas que parecem extravagantes 
são tão persistentes. No seio de um grupo, passam-se coisas estranhas. A
 influência normativa, o pensamento em comum, a intervenção de “polícias
 do pensamento”, a polarização, tudo isto são fenômenos que se conjugam 
para manter um grupo intacto e fazer com que as opiniões dissidentes 
sejam rapidamente postas à margem ou liminarmente rechaçadas, o que, em 
termos de descrição do processo, passa por fenômenos como a distorção da
 confirmação (tendência para favorecer a informação que confirme a 
hipótese de partida).
Conspirações, Deus e o sobrenatural
Há muitas outras explicações possíveis para o comportamento dos 
teóricos da conspiração. Pode mesmo ser algo tão simples e intuitivo 
como a compreensão de que essas teorias são reconfortantes. É 
perturbador pensar que haja grupos de lagartos gigantes que controlam 
secretamente a humanidade, mas a possibilidade de vivermos num universo 
aleatório, onde forças desprovidas de razão podem decidir nos eliminar 
sem motivo, será menos perturbadora?
As redes das teorias da conspiração
Talvez seja para afastar uma eventualidade desse gênero que alguns se
 voltam para as teorias da conspiração, como outros se ligam em Deus ou 
ao sobrenatural.
E antes que as mentes racionalistas que leem as crônicas científicas 
do jornal The Guardian comecem a demolir o que escrevi, acrescento que 
há opiniões mais comuns, hoje muito em voga, que podem facilmente se 
encaixar nos espíritos de outras pessoas que ali não veem teorias da 
conspiração. O sistema de saúde britânico está sendo secretamente 
privatizado e os meios de comunicação social são cúmplices? Sim, 
seguramente. O Governo está tentando asfixiar as instituições de 
solidariedade social? Claro! Ah, tem “provas”? As pessoas as arranjam, 
sempre.
Mas talvez a má fama de que gozam os teóricos da conspiração não seja
 totalmente merecida. Alguns dos maiores cientistas do mundo, como 
Darwin ou Galileu, foram os que questionaram a versão oficial dos 
acontecimentos. E, claro, há sempre a possibilidade de tais conspirações
 serem reais. E se este blog não for uma análise da psicologia das 
teorias da conspiração, mas um estratagema para bater o recorde dos 
“comentários mais delirantes” do site do The Guardian? Nunca o 
saberemos...
(...)
Atração por conteúdos enganosos
Episódios desse tipo levantam questões: como são as pessoas expostas a
 ideias e informações falsas e como acabam por se convencer da sua 
veracidade? Podemos aprender muito sobre esse assunto graças ao trabalho
 de Walter Quattrociocchi, da Universidade de Boston, que estudou o modo
 como as pessoas reagem a publicações no Facebook a informações cuja 
inexatidão está comprovada.
Esse pesquisador, com sua equipe, estudou como foi que mais de um 
milhão de pessoas havia interpretado as informações publicadas no 
Facebook durante as eleições italianas de 2013.
Observaram sobretudo 
quais as mensagens de que os utilizadores “gostavam” e comentavam em 
função das fontes consultadas: grandes órgãos de imprensa, mídias não 
tradicionais ou páginas dedicadas à análise política. Depois, estudaram 
como essas mesmas pessoas reagiam a notícias falsas publicadas por 
trolls ou seja, provocadores, em páginas conhecidas pelo seu conteúdo 
satírico, enganoso ou sectário.
Os resultados são fascinantes. Quattrociocchi e os seus colegas 
analisaram a duração dos debates, contando o tempo decorrido entre o 
primeiro e o último comentário. Essa duração é idêntica, qualquer que 
seja o tipo de conteúdo. Em outras palavras,   as pessoas tendem a 
debater em páginas tradicionais, não tradicionais e satíricas durante o 
mesmo lapso de tempo: o seu grau de envolvimento é o mesmo, seja qual 
for a natureza da informação.
Os investigadores quiseram depois comparar a participação dos 
internautas nos debates em função do carácter das informações em jogo, 
como no caso da lei fictícia. Concluíram que algumas pessoas eram mais 
propensas a participarem num debate que tivesse por base um conteúdo 
enganoso.
Designadamente, observaram que aqueles que se exprimiam em 
paginas não pertencentes à imprensa tradicional eram muito mais 
suscetíveis de participar num debate lançado por agitadores com base em 
ideias falsas. “Notámos que a maioria dos internautas que interagem com a
 provocação obtêm as suas informações, sobretudo. de fontes não 
tradicionais. Por isso estão mais frequentemente expostos a dados sem 
fundamento."
http://www.brasil247.com/pt/247/revista_oasis/165088/Teorias-da-conspira%C3%A7%C3%A3o-O-mundo-doido-dos-grandes-conluios-e-compl%C3%B4s.htm
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