sexta-feira, 13 de julho de 2012

De Woodstock ao Festival de Águas Claras

Por sugestão de Sônia Aranha do excelente blog “www.soniaranha.com.br
 
Paz, amor, bossa nova e rock’n’roll

Inspirada no ambiente de Woodstock, uma nostálgica legião de jovens se aventurou nos festivais de Águas Claras. Alguns hippies, outros nem tanto. E ouviu de Raul a João Gilberto, numa comunhão movida a música e liberdade
Entre 15 e 18 de agosto de 1969, 500 mil jovens se reuniram numa fazenda do estado de Nova York, nos Estados Unidos. O Festival de Woodstock, uma década depois do surgimento do rock, simbolizava, mais que a adolescência de uma vertente musical contestadora por natureza, uma comunhão. Ainda que acompanhado de perto pelo olho gordo da indústria cultural – do disco, do cinema, da literatura, da moda, da arte e do comportamento –, aquele palco entrou para a história como uma grande celebração de “paz e amor”, ao juntar estilos de Joan Baez a Santana, Ravi Shankar a The Who, Credence a Janis Joplin, Neil Young a Jimi Hendrix. Woodstock não foi o primeiro, mas foi o maior, mais eclético e inspirador. Iniciativas semelhantes pelo mundo nos anos seguintes iriam, mesmo que não intencionalmente, remeter ao festival.
O Festival de Águas Claras é um dos mais lembrados. Sua primeira versão, em 1975, ocorreu na Fazenda Santa Virgínia, no município de Iacanga (SP). “Eu havia escrito uma peça de teatro e juntei um grupo musical para fazer a trilha sonora. Surgiu a ideia de encenar ao ar livre e começaram a aparecer algumas pessoas interessadas em tocar com a gente”, conta o organizador Antônio Checchin Júnior, o Leivinha. “Aí fizemos o Festival de Águas Claras, que nunca teve a intenção de ser parecido com Woodstock, mas haveria essa associação com qualquer evento que fosse feito daquele jeito.”
Então com 22 anos, Leivinha utilizou a fazenda do pai como ponto de encontro de 30 mil jovens do Brasil e de outros países da América do Sul para ver grupos como O Terço, Som Nosso de Cada Dia, Mutantes, já sem Rita Lee, e Moto Perpétuo, do qual fez parte Guilherme Arantes. E por que a comparação era inevitável? “O público foi maravilhoso. Não tivemos uma briga nem nada que pudesse desprestigiar o festival”, lembra. “A história do nu do pessoal acontecia na hora do banho. Só um ou outro é que tiravam a roupa no meio do público, para aparecer. Apanhávamos laranja e milho, e o pessoal da fazenda fazia comida para distribuirmos.”
“Foi uma catarse coletiva e um exercício muito bonito de liberdade, numa época em que havia um anseio enorme de participação entre as pessoas e em que se provou que a causa de paz e amor bem que poderia ter dado certo”...

Ideias subversivas

O ambiente de ditadura dificultava qualquer evento que promovesse grandes reuniões. “Durante um mês e meio, eu ia praticamente todos os dias à Secretaria de Segurança tentar liberar o festival. Só consegui quando o secretário, na época o Erasmo Dias, me mandou para o Departamento de Ordem Política e Social (Dops) para assinar um termo de responsabilidade pelos atos de subversão que acontecessem”, lembra o organizador. “Depois me proibiram de fazê-lo novamente durante seis anos. Eles queriam nos prender de qualquer jeito, mas não tinham motivos, porque não era uma reunião política. Mesmo assim, levavam para o camburão quem estava andando pelado, mas a gente virava o camburão e todo mundo saía”, acrescenta Celsão.
Um documento emitido pelo então ministro da Justiça, Armando Falcão, guardado por Leivinha até hoje, relata a visão do regime militar para a ocasião: “Durante a realização (do Festival de Iacanga), o uso de entorpecentes, bebidas alcoólicas e atos imorais foram abertamente praticados; aproveitando-se do ambiente próprio, propagadores de ideias subversivas vinculavam propagandas com as seguintes frases: ‘Viva a Mocidade Socialista’, ‘Viva Che Guevara’, ‘Viva a liberdade estudantil’”.
Uma segunda edição do evento foi realizada só em setembro de 1981, com estrutura mais profissional, cobertura de TV e ingressos vendidos nas agências do Unibanco. Gilberto Gil, Luiz Gonzaga, Gonzaguinha, Alceu Valença, A Cor do Som, 14 Bis e Moraes Moreira estavam lá. “O show do Hermeto Pascoal varou a noite toda e o Egberto Gismonti tocou Palhaço, com grupo de palhaços que fazia a segurança dançando na frente do palco”, destaca Leivinha.
“O festival mantinha um espírito hippie tardio. O Brasil estava décadas atrás dos movimentos mais libertários e de contracultura europeus e americanos. Para se ter uma ideia, o romance On The Road, de Jack Kerouac, inspirador do ideário hippie, só chegou por aqui no início dos anos 80, com quase três décadas de atraso”.
O cinegrafista Adauto Nascimento prepara um documentário com material inédito registrado em 16 milímetros, 81 em Iacanga. “O festival reuniu grandes nomes da música brasileira e as pessoas iam para viver dias de harmonia e liberdade. A maioria se emociona ao falar dele. Todos querem ver essa história contada”, garante.
Um projeto de documentário também está sendo tocado por Thiago Mattar, com apoio de Leivinha. “Tem muita gente que nunca ouviu falar desses festivais, queremos mostrar que foi possível termos um festival de música nos moldes de Woodstock em plena ditadura militar”, diz o diretor, que espera finalizar o trabalho até 2012.
Texto: Guilherme Bryan

2 comentários:

  1. Que diferença....época onde procuravam qualidade, propriamente lucrabilidade, as letras muitas vezes falavam de questões políticas, sociais, culturais, manifestações....hoje basta falar das crises amorosas de adolecentes e pronto....fica-se rico em pouco tempo e cade a qualidade?!?!? hoje em dia basta ter uma dessas 3 coisas para o sucesso:
    1-sorte
    2-bom empresário
    3-youtube

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  2. como estamos em crise, a beira de uma explosão do sistema atual, então estamos a beira de movimentos como estes, é claro, que com uma nova roupagem e novos conceitos. abraços ! lucas

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