sábado, 7 de maio de 2011

Consumir menos, escolher melhor. Vida Simples

por  Luis Pellegrini.
                                                                                                                                   
Existe um jeito de aumentar o salário sem recorrer ao patrão: aprenda a gastar melhor o seu dinheiro. Para começar, esteja mais atento à relação preço/qualidade, tornando-se mais crítico e exigente. Sobretudo, aprenda a diferenciar necessidade e capricho, o que é essencial e o que é supérfluo. Use a cabeça: antes de comprar, estude cientificamente o que comprar, como e quando comprar, e reflita bem se vale à pena comprar. Especialistas afirmam que por si sós essas providências são suficientes para fazer economizar um terço do salário.
Conselhos desse tipo constituem os pressupostos básicos de uma nova doutrina que ganha um número cada vez maior de adeptos. Ela tem vários nomes:
downshifting (“trazer para baixo”, “baixar a bola”), simple living (“vida simples”), voluntary simplicity (“simplicidade voluntária”), todos sinônimos de um consumismo mais maduro.
Trata-se, em suma, de uma doutrina que nos aconselha a simplificar ao máximo nosso estilo de vida e a trancar com cadeado a carteira quando se trata de comprar. Ela deriva diretamente dos protestos hippies de contestação ao sistema capitalista da produtividade e do consumismo, e também das idéias mais recentes da ecologia e da sustentabilidade.
Iniciada no início dos anos 90, a onda do downshifting já dura mais de vinte anos e parece ser de longo alcance. Ela começou como reação à orgia yuppie dos anos 80 - época em que a obsessão pelos bens fúteis de consumo, pelas roupas de grife, e pelos fáceis ganhos financeiros marcou uma inteira geração. Tantos foram os excessos cometidos no período yuppie que parece natural o surgimento, em seguida, de um certo desejo de medida e de seletividade. Mas, deve-se considerar que agora, para essa decisão de viver e consumir de modo menos obsessivo, também contribuem a crise econômica mundial e o incremento da incerteza em relação ao futuro. Portanto, controlar melhor o consumo não é, para muitos, apenas uma decisão pessoal, mas sim um fato ditado pela pura necessidade. De qualquer forma, por uma razão ou por outra a proposta do downshifting encontra eco num número cada vez maior de pessoas.
Como o próprio nome parece indicar, as bases filosóficas da “vida simples” são exatamente isso: simples. Quem opta por ela prefere não sacrificar as relações com a família, com os amigos e a comunidade, em troca do avanço na carreira profissional; prefere não adiar ou desfigurar esperanças e ideais para fazer o seu “pé de meia”; prefere não se deixar contaminar pela luxúria do consumismo descontrolado.
Sinais claros dessa nova postura são detectados em toda parte, principalmente nos países desenvolvidos. Nos Estados Unidos, o Merck Family Fund, importante instituição dedicada ao estudo de fenômenos sociais, publicou os resultados de uma pesquisa de opinião pública que examinava a nova visão americana a respeito de consumismo, materialismo e meio-ambiente. Nada menos que 28% dos entrevistados afirmaram ter feito nos últimos anos modificações em suas vidas que resultaram em menor entrada de dinheiro (nesse número não entravam os que simplesmente se aposentaram). As modificações mais comuns eram a redução das horas de trabalho e a mudança para um emprego menos rentável, mas que permitia ao trabalhador passar mais horas em casa.
De acordo com a mesma pesquisa, 68% dos que “baixaram o nível” assim o fizeram porque optaram por uma vida mais equilibrada; 66% porque desejavam mais tempo livre; 63% porque queriam uma vida menos estressante; 53% para passar mais tempo com os filhos. No item mais surpreendente, 87% se declararam felizes com a mudança, e apenas 35% se sentiam de alguma forma atingidos pela redução da entrada em dinheiro.
“Há um número cada vez maior de pessoas estressadas e enervadas pelas exigências e pelo ritmo frenético da vida moderna, e frustradas pela sua incapacidade de encontrar alternativas viáveis que possibilitem uma saída dessa vida”, diz David Shi, presidente da Furman University, e autor de vários livros sobre vida simples. “Casas cuja manutenção é caríssima, mães obrigadas a trabalhar fora, jornadas de trabalho de doze horas, são coisas que estão levando as pessoas a superar seus limites máximos de resistência e a entrar em pane”, conclui David Shi.
Para esses cidadãos exaustos, embarcar na vida simples parece representar ao mesmo tempo uma forma de escapar à pressão esmagadora do sistema e uma lei histórica de compensação. Por um lado, o imperativo que sempre caracterizou a cultura ocidental da produtividade e do consumismo foi o de trabalhar cada vez mais e por mais tempo, de desejar mais e reclamar por mais coisas, de crescer sem parar enquanto nossos apetites e o meio ambiente onde vivemos o permitissem. Mas, ao mesmo tempo, outro ideal mítico continuou sempre a competir pela atenção das pessoas. Desse ideal fazem parte idéias românticas como aquela sintetizada na velha e aparentemente simplória frase “meu amor e uma cabana”, nas idéias do pensador Thoreau - que pregava o retorno à simplicidade de uma vida junto à natureza -, ou no desejo por tantos acalentado de desenvolver uma carreira de serviço útil ao mundo e à humanidade.
Duane Elgin, ex-professor do Stanford Research Institute, na Califórnia, e autor de Voluntary Simplicity, um best-seller do assunto, revela bom senso quando define esse movimento: “Podemos descrever simplicidade voluntária como uma maneira de viver que é muito mais simples por fora, porém muito mais rica interiormente. O objetivo não se baseia de forma dogmática no viver com menos, mas sim na intenção de viver de forma mais equilibrada, de modo que a vida possa ter maior propósito, ser mais plena e mais satisfatória”.
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http://www.brasil247.com.br/pt/247/revista_oasis/997/Consumir-menos-escolher-melhor.htm

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