Com criatividade e inovações no projeto pedagógico, alguns colégios
da rede pública alcançam notas acima da média nacional no Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), do Ministério da Educação.
Pelo menos três instituições são vistas como exemplos às demais.
É raro encontrar uma família que confie a educação dos filhos a um
colégio público por escolha e não por necessidade. Com a degradação do
ensino gratuito no cenário nacional, muitos acreditam que os estudantes
terão uma formação deficiente, especialmente nos primeiros anos de vida
escolar. Mas algumas das 402 instituições de ensino fundamental do DF
provaram o contrário. Alcançaram notas acima da média nacional no Índice
de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), medido pelo Ministério da
Educação, sem terem privilégio sobre as demais. Nenhuma delas recebeu
verba extra do governo ou funciona em palacetes. Trabalham contra todas
as dificuldades. Ainda assim, encontraram a excelência por meio do
comprometimento de gestores e professores, além de apostar em ações
criativas.
O segredo é simples. É uma soma entre o envolvimento ativo dos
pais, as políticas pedagógicas regidas por metas e as avaliações de
erros para a construção de acertos. Melhores resultados também foram
notados após a redução de alunos por turma e na adequação dos projetos
de ensino às necessidades de cada região. Guiado por um estudo da
Universidade Católica de Brasília (UCB), o Correio visitou três
instituições de ensino fundamental que desenvolveram modelos de sucesso.
Uma delas é a Escola Classe 03, do Paranoá. Mesmo instalada em uma
cidade periférica e pobre, a instituição alcançou nota 6,7, similar ao
índice médio do ensino privado no DF, de 6,8. Entre 783 alunos
atendidos, ali, está Luana Cristina Damasceno, 10 anos. Em oito meses,
ela leu nove publicações. “A cada livro, conheço um mundo diferente. Vim
de uma escola sem esse tipo de incentivo. Aqui, aprendi mais palavras e
melhorei a interpretação”, disse.
A paixão de Luana pelo hábito nasceu no espaço construído a duras
penas, no centro de ensino sediado há 20 anos num local que era para ser
provisório. Só saiu do papel com o dinheiro de bazares e de festas
organizadas pela instituição. O incentivo à leitura foi uma aposta da
direção para fortalecer a formação dos estudantes. “Não somos uma escola
de 1.001 projetos. Escolhemos um, no caso, a leitura, para ser o ponto
forte. Os alunos devem saber interpretar uma diversidade de gêneros
textuais, desde a literatura até uma bula de remédio”, detalha o
vice-diretor da instituição, Cássio de Azevedo Guedes.
A Escola Classe 03 não conta com vários requisitos necessários para
o bom desempenho. Metade dos computadores do laboratório de informática
está quebrada, aguardando uma manutenção do MEC, que parece não chegar
nunca. Em dias quentes, as telhas de amianto fazem a temperatura das
salas de aula alcançar os 40 graus. Ainda assim, o colégio aparece entre
os melhores do DF.
A escola é acompanhada pelo Núcleo de Ensino, Aprendizagem e
Formação de Professores da UCB. Coordenadora da pesquisa, a professora
Lêda Gonçalves investiga o desenvolvimento humano em contextos
socioeducativos diversos e quis ver de perto o porquê dos índices
positivos. “Em uma das instituições que concluímos a pesquisa,
observamos o desenvolvimento de um projeto pedagógico com metas,
independentemente da gestão. O foco é o aprendizado por meio da
provocação dos estudantes, contribuindo para o desenvolvimento da
autonomia deles. Não é somente um professor copiando a matéria no
quadro”, detalhou.
Em Taguatinga, em meio a tantas escolas com rendimentos acadêmicos
fracos, a Escola Classe 39 é uma ilustre exceção. O Ideb da instituição é
6,8, enquanto a avaliação de outros centros de ensino da mesma cidade
não passa de 4,0. Lá, um dos fatores de sucesso é o estabelecimento de
metas educacionais. O projeto pedagógico é feito a longo prazo e, não,
anualmente. O diagnóstico de determinados erros acontece periodicamente,
impedindo a repetição deles no futuro. “Não há milagre na educação. Uma
fórmula nova não é criada para mudar tudo como num passe de mágica. As
experiências com questionários respondidos por professores, pedagogos,
pais e alunos causam uma reflexão, que, posteriormente, é transformada
em ação”, explicou a vice-diretora, Karine Silva Pereira.
Um exemplo: há dois anos, uma das avaliações expôs a deficiência no
aprendizado de matemática. A solução foi matricular os professores em
um curso na Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação
(Eape), da Secretaria de Educação. “Surtiu resultado, identificamos
novos métodos de ensinar e incentivar os alunos”, completou Karine.
Participação
Na 4º e na 5º série, o primeiro lugar no ranking do Ideb no DF
ficou com a Escola Classe 314 Sul. Os 7,1 pontos obtidos na Prova Brasil
— base para formular o exame — são bem superiores aos 5,0 alcançados no
país e à média de 5,7 do DF (veja ilustração). Um dos pilares do bom
desempenho é a interação da equipe e a participação da família no
ensino. Para se ter ideia da intensidade do envolvimento dos pais com o
ambiente escolar, a frequência de participação deles em reuniões com os
professores supera 80%, raridade até mesmo nas escolas particulares.
“Eles complementam o trabalho realizado em sala de aula, participam de
todas as etapas da vida do aluno na escola e sugerem melhorias. Isso
aumenta em 60% o aprendizado das crianças”, exemplificou a diretora,
Sandra Niel de Melo.
Embora seja uma rede, as boas práticas, no entanto, não se repetem
em todas os colégios. Entre as 336 pesquisadas pelo MEC, 253 apenas
alcançaram a média do DF. A coordenadora do Ensino Fundamental da
Secretaria de Educação, Kátia Franca, ressalta que a capacitação dos
professores é feita, mas a direção e as ações pessoais fazem a
diferença. “As escolas têm autonomia. Alguns fatores contribuem para
isso: as iniciativas individuais, a formação dos gestores e a
participação da comunidade no ambiente escolar”, enumerou.
Colaborou Ariadne Sakkis
Destaque
Ela está abaixo somente do Colégio Militar Dom Pedro II, que
adquiriu a média 7,2. Mesmo assim, a Escola Classe 314 Sul pode ser
considerada a primeira pública porque a outra tem caráter híbrido
(pública e privada). O colégio é subordinado à Diretoria de Ensino e
Instrução (DEI), pertencente ao Corpo de Bombeiros Militar do Distrito
Federal (CBMDF) e não recebe verba do governo para fazer manutenção.
"As escolas têm autonomia. Alguns fatores contribuem para isso: as
iniciativas individuais, a formação dos gestores e a participação da
comunidade no ambiente escolar”
Kátia Franca, coordenadora do Ensino Fundamental da Secretaria de Educação
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