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terça-feira, 30 de maio de 2017

Os governos do PT e o neoliberalismo

Em que medida, o neoliberalismo é incompatível com a democracia – principalmente a chamada democracia de alta intensidade?

O principal ponto do neoliberalismo é que se os mercados funcionarem perfeitamente pelo mecanismo de preços garante-se, segundo seus modelos, a mais eficiente alocação dos recursos, equilíbrio geral da economia, distribuição da renda segundo a participação de cada fator produtivo na produção. Qualquer mecanismo que impeça o funcionamento livre do mercado é o responsável pelos problemas econômicos e sociais.

Se a democracia escolher grupos que implementem essas políticas, tudo certo. Caso contrário, abre-se mão da democracia sem nenhum problema. Não é por outra razão que o neoliberalismo na América Latina teve sua primeira experiência nos anos 70 do século passado, justamente nos governos de ditadura militar.

Os governos populares recentes de Lula e Dilma, mais à esquerda, e outros governos semelhantes em países vizinhos na América Latina, podem ser considerados como exemplos de “desobediência” à ordem neoliberal? Ou isso é, em parte, ilusão?

Isso é, em boa parte, ilusão. Há um grande debate sobre o caráter neoliberal ou não dos chamados governos progressistas na América Latina no começo do século 21. Tudo depende de como entendemos o neoliberalismo.

Este último, para ser rigoroso, não pode ser confundido com políticas econômicas (monetária, fiscal e cambial) ortodoxas. O que o neoliberalismo defende é que, qualquer que seja a política econômica, ela obtenha a estabilização dos preços e das contas públicas. Em segundo lugar, e isto é o distintivo do neoliberalismo, reformas estruturais de liberalização e desregulamentação de mercados, incluindo privatizações (com qualquer nome que elas tenham) promovem, segundo esse pensamento, o aprofundamento da lógica mercantil e da concorrência, o que estimula investimento e crescimento da economia, junto com maior distribuição do mesmo.

O que alguns dos chamados governos progressistas fizeram foi manter a política econômica pró-estabilização e manter e/ou aprofundar as reformas pró-mercado.

Alguns respondem que, junto a isso, vieram as políticas sociais. Mas, se observadas com rigor, com caráter focalizado e compensatórias, ou seja, não estruturais. Tanto é assim que, com a mudança de governos, são facilmente revertidas. Diga-se de passagem, políticas sociais defendidas e respaldadas pelo Banco Mundial. Não é a existência ou não de políticas sociais que define uma estratégia como neoliberal ou não, mas a forma dessas políticas.

Os governos do PT fizeram exatamente isso, e nada além disso. Aproveitaram-se de um cenário externo extremamente favorável para, com o aumento da arrecadação estatal, promover uma estratégia neoliberal com conciliação de classe.

Trecho da entrevista ao Brasil Debate, Marcelo Dias Carcanholo, presidente da Sociedade Brasileira de Economia Política (SEP),

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